Uma mentira dita mil vezes…

Uma mentira dita mil vezes…

Há poucos dias, uma pessoa me perguntou se tomaria a terceira dose da vacina. Disse que já havia tomado.  Contou-me que estava com muita dúvida, que já havia recebido a primeira e a segunda dose, mas relutava para a terceira e também estava pensando se deixaria o filho receber o imunizante. Alguém lhe tinha dito que a vacina seria uma espécie de chip capaz de localizar a pessoa onde estivesse no mundo. Imediatamente, lembrei várias coisas que ouvi durante todo esse tempo – que a China desenvolveu esse vírus propositalmente para infectar o mundo, que a vacina seria uma forma de implantar o número da Besta (uma imagem escatológica descrita pelo Apocalipse) na população mundial, que para se prevenir do COVID bastava beber chá de limão com mel e até a suposição governamental de que quem se deixasse vacinar correria o risco de se transformar num jacaré. Agora, já no início da campanha eleitoral vieram com a “notícia” de que se o atual governo perder o poder, as igrejas evangélicas serão extintas no país. Não bastassem essas aberrações, pairam sobre o tempo informações desconexas sobre o número de infectados no Brasil, além de uma escuridão nos subsolos de ministérios, onde vacinas, negócios, senadores, reverendos e laboratórios continuam sendo assuntos de difícil acesso, fazendo com que tenhamos a impressão de estarmos sob a judicie da mentira.

A frase: “Uma mentira dita mil vezes torna-se verdade” é atribuída a Joseph Goebbels, ministro da propaganda na Alemanha nazista que assessorou Adolf Hitler na empreitada de tentar dominar o mundo. Com essa teoria, o nazismo foi implantado, criando “verdades” a partir de mentiras ditas para viabilizar a ascensão de um mito que se tornasse ícone mundial capaz de exterminar quem fosse diferente. Acontece que o holocausto matou sete milhões de judeus por todo o mundo, deixando uma mancha de sangue na história. Esse foi o preço pago pelas mentiras acreditadas, pelo aplauso a um ídolo falsificado, pelo apoio a um mito construído pelo interesse de quem se achava superior aos outros.

Quem mais me espanta nesse “reino da mentira”, é a parte dos evangélicos “terríveis” de nosso país. Porque diferentemente dos ávidos leitores de bíblia que conheci enquanto pregava nos púlpitos do meu pastorado, empenhados, com o Livro Sagrado aberto enquanto eu discorria sobre o evangelho, para conferir se minhas palavras eram coerentes ao anúncio de Deus, hoje engolem passivos, saboreando prazerosamente qualquer informação que lhes chega com a tarja da república. Aceitam como voz profética qualquer coisa que lhes digam, como se a própria voz de Deus estivesse sendo pronunciada. Ao invés da crítica, tão evidente na postura de Jesus, submetem-se cativos a qualquer pastor. Não se vacinam, não se ofendem diante de palavrões, apoiam a morte de quem não lhes seja concordante, compram armas, são insensíveis desprezando a misericórdia e a compaixão pelos pobres. E quando adoecem e morrem, destino natural de quem não se vacina, dizem sublimando: “Foi a vontade de Deus”, jogando para o Soberano o ônus da imprudência e da falta de sabedoria, pela obediência cega ao “messias” desse tempo.

Sinceramente, não reconheço mais o protestantismo que conheci na infância. Não sei onde estão aqueles homens e mulheres que se indignavam contra a fome, contra a dor e o preconceito. Procuro desesperadamente as mulheres que se uniam para fazer enxovais aos recém-nascidos das Santas Casas (gerenciadas pelas Freiras – não havia divisão entre evangélicos e católicos, havia amor pelos necessitados), não sei onde estão os homens íntegros que se ofendiam com a desigualdade e se juntavam para construir casas nos finais de semana para os necessitados. Não sei onde está a igreja que se levantava em favor da educação dos mais humildes. Hoje vemos um pastor-ministro dizendo que pobre não tem que sonhar com faculdade, que isso não é pra qualquer um. Tudo o que vemos agora são pessoas indiferentes, desumanizadas, que louvam a injustiça, a ofensa e o desrespeito.

Qual será o fim de um país que se deixa levar por uma cultura mentirosa? Qual será o diferencial de uma igreja que se fascina por ídolos sustentados por inverdades e se joga nos braços do “pai da mentira”? Parece que a palavra agora cobra seu preço voltando-se contra quem a pronunciou com tanta veemência… “E conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará” (Evangelho de João, capítulo 8, verso 32).

 

 

Prof. Dr. Rev. Nilson da Silva Júnior é pastor e professor.

revnilsonjr@gmail.com

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