Nas salas de aula é preciso conhecer a história e se afastar o silêncio

Nas salas de aula é preciso conhecer a história e se afastar o silêncio

Ao final de 2022, um dos colégios privados que recebe filhos da elite piracicabana teve que promover uma reunião de pais e professores diante das reclamações de parte expressiva desses pais de que as aulas de história estavam corrompidas pela intenção de “doutrinação” de um professor, que teria exposto fatos sobre “democracia”. Em setembro do ano passado, outra instituição de ensino registrou a interferência de área não relacionada à orientação pedagógica, criticando trabalho escolar de adolescentes que defendia a população LGTBQIA+.

Diante desse quadro, não é exagero afirmar que o 31 de março possivelmente passará em silêncio na maioria das instituições de ensino de nossa cidade e mesmo fora dela. Seja por pressões das direções tentando evitar que o assunto ainda considerado delicado – especialmente diante da polarização política atual – possa gerar problemas, seja pelos próprios docentes, os poucos que ainda tentem se arriscar, lamentando a falta de material de apoio para uma abordagem adequada.

O que pouco se divulga é que existem, hoje, materiais didáticos de alta qualidade pedagógica que poderiam ser utilizados nas escolas para se falar dos 60 anos do golpe militar. Como fazer os mais jovens entenderem o que realmente é uma ditadura? Como ela ameaça o cotidiano de cada um? Como explicitar que a tentativa de 8 de janeiro de 2023 efetivamente buscou retomar um período semelhante ao de 60 anos atrás, quando os direitos políticos, sociais, de liberdade de pensamento e crença, de garantia de manifestação e de proteção ao cidadão poderiam novamente, pela força e pela ilegalidade, serem desconsiderados.

Em janeiro deste ano, o Instituto Vladimir Herzog relançou o portal Memórias da Ditadura, dando destaque ao Portal do Educador (https://memoriasdaditadura.org.br/apoio-ao-educador/) Ali, de forma clarae objetiva, é possível encontrar sequências didáticas que abordam desde o golpe militar em 1964, repressão, tortura e censura, as diferentes formas que a ditadura afetou grupos de mulheres, indígenas, negros, LGTBQIA+ e outras minorias. Já com planos de aula específicos para o ensino básico e sugestão de atividades extraclasse, é possível consultar o projeto desenvolvido na Universidade Federal de Goiás, intitulado “Sequência didática: ensinar sobre ditadura com democracia” pelo link https://educapes.capes.gov.br/bitstream/capes/703586/3/SEQU%C3%8ANCIA%20DID%C3%81TICA%20ENSINAR%20SOBRE%20DITADURA%20COM%20DEMOCRACIA.pdf

Dez anos atrás, quando o golpe de 64 completava meio século, outros sites também surgiram e se mantiveram atualizados visando recolher informações mais amplas sobre todo o processo. Vale consultar, por exemplo, a publicação

https://www.historiadaditadura.com.br/documentosdadiradura, acompanhados por rápidos comentários de como se perseguiam e se vigiava músicos, cineastas, promotores de cultura, assuntos de maior apelo entre os mais jovens. Ou então acessar https://memorialdaresistenciasp.org.br/wp-content/uploads/2022/06/CADERNO-DE-EXPERIENCIA-EDUCAR-CONTAR-E-BRINCAR-PARA-RESISTIR.pdf, onde amplo material indica como trabalhar a temática inclusive com crianças.

A questão da pressão a professores que durante a ditadura militar foram acusados e perseguidos pelas aulas que ministravam, aqui mesmo, em Piracicaba, pode ser melhor conhecida no livro “Piracicaba, 1964”, entre as páginas 191 a 200. O acesso ao download gratuito é feito no endereço http://editora.metodista.br/publicacoes/piracicaba-1964

Se você é professor e está sendo pressionado a se manter calado sobre esse tema, faça contato pelo email (diariodoengenho@gmail.com). Para os mais jovens é preciso lembrar que até mesmo a disciplina História foi suprimida em 1971, trocada pela disciplina Estudos Sociais, que devia concentrar conjuntamente abordagens de História como de Geografia. Só se poderia utilizar livros didáticos que tivessem o carimbo de aprovado pela censura. Até 1984, o golpe militar só podia ser mencionado como “revolução contra o comunismo”. E a pressão dos pais aos que já tentavam driblar esse controle acontecia com frequência sobre os professores e professoras.

O golpe e seus efeitos não podem se repetir. E isso começa pelo que se diz e se ensina nas escolas.

Quem quiser conhecer melhor sobre o que sofreram de pressões e intimidações os professores e as professoras de Piracicaba nos anos seguintes ao golpe de 64 pode acessar o download gratuito do livro “Piracicaba, 1964”, em  http://editora.metodista.br/publicacoes/piracicaba-1964  nas páginas 191 a 200.

 


Beatriz Vicentini é jornalista e coordenadora/editora do livro “Piracicaba, 1964 – o golpe militar no interior”. Em parceria com o Diário do Engenho, editora esta série para o site.

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