Brigadeiro “Calombudo” – por Carla Ceres

Brigadeiro “Calombudo” – por Carla Ceres

Brigadeiro

Ah, as felicidades gastronômicas! Se os seres humanos fossem justos, colocariam estátuas em sua homenagem, em cada praça de alimentação. Já tivemos deuses do amor, da beleza, da riqueza, das artes, da sabedoria. Por que não louvamos devidamente a felicidade que um alimento saboroso nos proporciona?

Só os prazeres do paladar resistem a reavaliações. Se você comeu algo gostoso, essa experiência vai continuar positiva mesmo que mais tarde você descubra que os ingredientes não eram os tradicionais. Já uma louca noite de amor com alguém que, na manhã seguinte, você descobre não ser do estado civil, do sexo ou do planeta que você esperava será lembrada com diferentes graus de arrependimento.

Vários relacionamentos terminam com frases do tipo “Eu pensei que nós éramos felizes, mas foi tudo ilusão”. Que maluquice, criatura! Você foi feliz, mas, agora, já era. Quem mandou reavaliar? Nem boas lembranças ficarão. Todas terão sabor e perfume de chifre queimado. O amor é frágil. Muito mais frágil que uma pizza quatro queijos. Uns bons pratos de comida podem nos engordar, aumentar nosso colesterol e, em condições sanitárias adversas, até nos mandar pro hospital com intoxicação alimentar. Podem, enfim, fazer miséria com nossa saúde e autoestima, porém jamais deixarão de ter sido uma delícia. Ninguém jamais dirá que os prazeres proporcionados por uma torta de maracujá foram “tudo ilusão”.

Tá bom, você não gosta de torta de maracujá, despreza as propriedades calmantes que levam seus apreciadores a ir comendo e relaxando até dormir sobre as migalhas. Talvez prefira trocar a gula relax pela euforia acneica de uma overdose de chocolate. Tanto faz. Quer você almoce de graça, na casa da tia Mirtes, que faz o melhor brigadeiro calombudo do universo, quer entre no cheque especial para pagar a conta de um restaurante fino, ainda se lembrará da refeição com alegria.

As divindades gastronômicas assumem diferentes formas de acordo com o gosto do apreciador. Para mim, sua materialização perfeita é o brigadeiro calombudo. Qualquer receita de brigadeiro serve. Só não podem faltar leite condensado, chocolate em pó e um estabanamento que faça tudo isso empelotar e quase queimar. Fica com uma aparência horripilante, mas delicioso. Partilhar uma panela desse desastre é uma tremenda prova de amor por quem o preparou. Por sua vez, o autor da proeza demonstra confiança em nosso carinho. Não levará a mal as piadas e talvez nos convide para degustar os resultados das próximas tentativas. Brigadeiro calombudo é o errado que dá certo. É dos deuses.

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carlicatura Carla Ceres

 

 

 

 

 

Carla Ceres é escritora

24 thoughts on “Brigadeiro “Calombudo” – por Carla Ceres

  1. Comer é mesmo um dos melhores prazeres da vida.
    E eu vi que você, Carla, é do time do meu filho Guilherme. Não conheço ninguém que goste de brigadeiro como ele…rsrs E o brigadeiro especial mais que especial pra ele é o “da madrinha”. Eu tento, tento, ele experimenta e diz… “ainda não tá igual ao da madrinha”. Ai!
    Agora, lendo seu texto, me deu a maior vontade de comer uma pizza quatro queijos. São 17h49… o horário tá começando a ficar propício pra eu realizar o meu desejo.
    Desejo um ótimo final de semana pra você.

  2. Minha querida

    Um texto muito profundo, pois cada um sente o sabor do que comeu ou viveu de maneira diferente, mas por um momento sentiu que não foi ilusão, estava lá.
    Adorei a maneira leve com que falaste de coisas sérias…as entrelinhas foram saborosas.

    Um beijinho com carinho
    Sonhadora

  3. Bem final de semana… Loucuras gastronômicas… Penso logo em uma boa massa e um belo vinho tinto! Perfeito para minha degustação! De brigadeiro não tenho doces lembranças, mas da broa de fubá assada na folha de bananeira na brasa do fogão à lenha da minha avó com o café, colhido, torrado, moído e feito por ela… ah! Isso me traz doces lembranças!!
    Bjks. Célia.

  4. PER-FEI-TO. E eu queria estar com disposição para comentar sobre a parte séria da coisa, mas vou ficar com o brigadeiro calombudo, que é, de fato uma delícia. Não gosto do brigadeiro mole, que acaba logo. O bom mesmo é quando dá errado, e rende, rende…
    Tenho uma amiga que, quando os netos pequenos iam passar a tarde na casa dela, ela fazia um brigadeiro calombudo e duro… entregava a preciosidade à turminha e assim a tarde se passava tranquila, sem brigas nem acidentes domésticos. Sabedoria de vó!
    Beijo, querida!

  5. lendo o texto e viajando no tempo, fui parar em 1974-75 e lembrar de quando aprendi fazer brigadeiros, com 7 ou 8 anos de idade, minha mãe uma doceira e salgadeira profissional, nos dias em que tinha encomendas em demasia me colocava para ajudar na cozinha e minha função era mexer o brigadeiro, em pouco tempo o brigadeiro ficou por minha conta e lembro a receita até hoje, e não vá pensar que eram feitos de uma ou duas latinhas, não, eram no minimo 5 ou 6 latas, e ai de mim se ficassem calombudos..rsss, minha mae dizia: não deixe colar no fundo senão empelota, mexa rápido, assim teu braço fica forte igual ao do tarzan! foram alguns anos e nada de ficar forte igual ao tarzan, mas a raspa da panela era minha, e isso compensava todo trabalho.
    assisti alguns anos atras o Silvio Santos perguntando para o Roberto Carlos porque seus casamentos não haviam dado certo, e Roberto disse que havia dado certo sim! que ele foi feliz em cada um deles.
    Parei para analisar e concordo com o raciocínio do rei, fui feliz em cada relacionamento.
    Homens e mulheres são diferentes, enquanto homens sequer pensam ao entrar em uma relação, mulheres pensam e repensam.
    Assim tenho que concordar com a teoria do calombudo, enquanto a atenção esta no degustar do brigadeiro, essa mulherada não fica repensando a relação! rsssss.

    1. rsrsrsrsrs Concordo com você, quanto aos relacionamentos, Idinaldo. Imagino a força que um menino de 7 ou 8 anos tem que fazer pra não deixar empelotar uma panela grande de brigadeiro. Mas ficar com a raspa da panela, sem dúvida, compensa. É a melhor parte. 🙂 Abraço!

  6. fiquei imaginando, se minha mãe soubesse os milagres que fazem os brigadeiros calombudos, tinha ficado rica, era só patentear a receita e vender felicidade a todos casais em crise, nem essas videntes que trazem o amor de volta em x dias seriam páreos a concorrência dos calombudos! rsss

  7. Olá prezada Carla, e que tudo esteja bem!

    Com certeza você tem a minha concordância. Brigadeiro, calombudo ou não é realmente uma das delícias inesquecíveis e, qualquer sofrimento decorrente serão apenas meros instantes em desconforto, ou não, mas ainda assim continuamos encantados, (risos)!
    Obrigado por compartilhar mais este belo e também delicioso escrito, sempre com o teu estilo, humorado sem deixar de lado a seriedade!

    E grato por tuas visitas e gentis comentários e amizade, eu desejo que seja sempre deveras intenso e repleto de delicias o teu viver, abraços e, até mais!

  8. Oi minha amiga Carla. Brigadeiro é sem dúvida um dos melhores doces já inventados… mas uma torta Marta Rocha também é uma maravilha… que tal um excelente jantar a luz de velas então? nossa, nada melhor. Pena que a gente coma, de um simples arroz com feijão ao melhor e mais requintado dos pratos e eles, seja qual for o alimento… acabe tudo em M…, algumas tão fedidas que nem parece que acabamos de desfrutar de uma deliciosa refeição… coisas e mistérios da vida né… kkkk, acho que acabei com o teu texto, sem querer.
    Olha, veja bem a foto da igreja… acho que te peguei… sem querer… não tem nada demais nela… o que parece uma entrada nada mais é do que uma GRUTA em frente a mesma… mas a impressão que dá é que é algo diferente né…
    Sobre as Prefeituras Municipais… eu também não sabia… por isso passei a informação adiante… afinal blog também é cultura.
    Um grande beijo.

    1. Vou pesquisar como é essa torta Marta Rocha, Clemente. Pelo nome, deve ser sensacional. Seu comentário me fez lembrar da Rita Lee. 🙂 Beijos pra você e pro Bolinha!

  9. Se brigadeiro já é bom,em sua cronica ficou ainda melhor! Gostei da comparação do amor e da gastronomia. A única coisa que me causa arrependimento são os quilinhos a mais depois,mas o prazer dessa gula,fica pra sempre e sempre vale a pena…rsss…Adorei te ler,beijinhos,

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