Até quando, Piracicaba? (Luto pelos animais)

O contrário da civilização é a barbárie. Na civilização, os seres sociais vivem coletivamente em harmonia. Na barbárie, os seres se devoram. Numa sociedade civilizada, respeita-se a lei a todo custo – afinal, fruto de acordo coletivo, condição fundamental para que a vida caminhe sob a lógica e a razão, a lei existe para ser cumprida. Na barbárie, a lei é a do mais forte, a do mais bruto, a do mais violento – pois na barbárie a lógica é a da sobrevivência a qualquer custo. Na civilização, as pessoas andam despreocupadas pelas ruas. Isso porque os civilizados – e por isso são chamados assim – sabem que só se pode viver em harmonia quando o direito de todos – de todos, mesmo! – é legitimamente respeitado. Na barbárie, não. Na barbárie os homens e as mulheres devoram-se uns aos outros – triturando seus semelhantes. Na barbárie ninguém é poupado, nem mesmo as crianças ou os animais.

Não bastam prédios e pontes para se viver em sociedade. Não são suficientes as praças e as habitações para se fazer do ser humano – ou do “dito” humano – um ser civilizado. Para “ser civilização,” a premissa fundamental vai muito além da arquitetura, do cimento e dos grandes empreendimentos da construção civil. Da mesma forma, não bastam leis para se criar ou se delimitar um mundo civilizado – mas é preciso que as leis sejam justas, pensadas, funcionais e – acima de tudo – é preciso que elas atendam a todos os seres e que, sem exceções, sejam cumpridas. Ao contrário disso tudo, o mais é simples barbárie. Sim! Quando as leis – se existentes – beneficiam a grupos determinados, quando leis não são justas ou não são cumpridas, inevitavelmente desvela-se a barbárie: barbárie pura, barbárie suja de sangue.

Isto posto, piracicabanos, cabe a todos nós a pergunta: vivemos nós, em nossa cidade, a plena civilização ou a barbárie? Ao nos defrontarmos em cada esquina com um pedinte esfomeado, ao sabermos da quantidade de jovens e adultos perdidos no mundo terrível das drogas, ao nos trancarmos em nossas casas a sete chaves – presos em nossa própria residência a fim de nos protegermos da violência das ruas –, ao vermos a nós e a nossos semelhantes privados do merecido e decente auxílio médico (seja ele público ou particular), inevitavelmente temos de nos perguntar: vivemos a civilização ou a barbárie?

Saiba, prezado leitor, que mais uma vez a cidade de Piracicaba sujou-se de sangue diante de seus vizinhos. Mais uma vez fomos alvo de matérias impressas e televisionadas que denunciaram – justamente – o nosso estado de não civilizados. Não bastassem os casos de extrema violência contra a vida humana – caso esses que neste ano já quebraram todos os recordes de anos anteriores – escancarados aos olhos amedrontados da cidade, agora Piracicaba entrou definitivamente para o rol terrível das cidades campeãs de casos bárbaros de violência contra os animais. Sim, conterrâneos. Em nossa cidade, cujo hino exalta as “flores e os encantos,” o vermelho do sangue animal borra diariamente a nossa identidade.

Cidade de bárbaros, nos últimos meses já se viu em Piracicaba toda sorte de crueldades contra nossos animais. Quantas e quantas vezes os mais variados órgãos da imprensa já noticiaram atrocidades inimagináveis contra os mais variados bichos (como cães e gatos largados a morrem de fome dentro da casa de seus próprios proprietários, cavalos deixados à míngua em terrenos baldios, gatos misteriosamente envenenados)? Quantos casos bárbaros já invadiram os jornais ao longo deste ano (como o do cachorro que teve as patas amarradas e foi jogado em um córrego da cidade)? Mas a sociedade “civilizada,” senhores, acha que a vida está em ordem. Pior, acha que a questão da violência contra os animais é uma bobagem, um exagero de um grupo de pessoas que deviam se preocupar com causas mais nobres…

Nesta semana, porém, a barbárie se pôs mais uma vez à sua própria prova! Sim. Lembrando os gladiadores romanos que arrastavam suas vítimas presas às rodas das bigas, um “cidadão piracicabano,” um legítimo filho da terra “cheia de flores e cheias de encantos,” arrastou – com sua caminhonete – o seu próprio cachorro pelas ruas de nossa cidade. Incrível? Absurdo? Não para os nossos bárbaros. Por isso, é preciso recontar o caso. Vamos lá, pasmem: cansado do cão que ele próprio criava, um piracicabano foi visto arrastando pelas ruas de Piracicaba um lindo e forte Rottweiler, acorrentado a uma caminhonete! Que belo exemplo de civilização. Que belo exemplo de humanidade!

E nossas leis, o que dizem? E nossos governantes, o que fazem? E a nossa “civilidade,” a nossa civilização, o que é dela? Não há mais escolha, senhores leitores, não há mais escolha! Nosso painel já está estampado, como num cruel mosaico romano: somos a barbárie – crua, posta e sangrenta. Somos a barbárie, senhores! E, com a alma suja de sangue, o que nos resta agora é saber se nunca evoluiremos. Piracicabanos! Somos a barbárie. E o que nos resta agora é saber: até quando?

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(Por uma delegacia de proteção aos animais, já!)

2 thoughts on “Até quando, Piracicaba? (Luto pelos animais)

  1. Mais que um absurdo, isso que aconteceu é nojento. Essa pessoa precisa responder criminalmente por esse ato de covardia e bárbaro.
    Não vamos nos esquecer, vamos ficar a tentos com o andamento do caso para que não caia no esquecimento.

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