Virgilinho desce ao inferno.

Virgilinho desce ao inferno.

caipiraO futebol era uma arte e os jogos aconteciam somente aos domingos. Esse era um dia esperado por todas as crianças que moravam nas proximidades do Estádio Roberto Gomes Pedrosa (campo do XV, onde hoje está o supermercado “Extra”). Havia um zelador que residia com toda sua família nas dependências do estádio, seu nome era “Sêo” Virgílio. Seu filho, nosso amigo, era chamado de Virgilinho.

Nossa vida depois das aulas no grupo Moraes Barros era também assistir aos treinos do XV ou brincar nas arquibancadas daquele gigante de concreto, o campo do XV. Aos domingos, dia de jogo, o “bafafá” começava já pela manhã, quando o pessoal das rádios e das emissoras de televisão preparavam seus aparelhos para a transmissão do jogo que aconteceria no período da tarde.

Às vezes, quando era impossível entrar pela casa do Virgilinho ou pular o
muro que era vigiado por soldados montados em seus cavalos,  nós então ajudávamos aos vendedores de paçoquinhas (as legítimas, cortadas em forma triangular), amendoim torrado ou sorvetes Kibon, que eram vendidos durante o jogo. Isso permitia que nós, vendedores, assistíssemos aos jogos gratuitamente.

Nosso amigo Virgilinho sempre foi uma figuraça. Além de ajudar seu pai na limpeza do estádio, ele também trabalhava, às vezes, no marcador da partida que ficava localizado num lugar alto, para que todos pudessem ver a contagem do jogo. Para chegar até ele, havia um corredor atrás de um dos gols (lugar de bastante trânsito e que ligava as duas torcidas dos dois lados do estádio).

Certa vez, o XV jogava com um time fraco, do interior (tempo em que o XV era uma grande equipe formada por grandes ídolos), e começou a marcar um gol atrás do outro, para desespero do time visitante e do Virgilinho, que trabalhava no marcador.

Não houve dúvida, o garoto desceu a escada do marcador, passou entre aquele “inferno” de pessoas acumuladas no  corredor e  foi até a lateral da Rua Regente (vizinho dos vestiários), chamou o técnico do XV (o estádio era muito apertado, sendo possível quase tocar nos jogares ou na equipe sentada na beirada do campo) e  gritou o Virgilinho:  Fulano, por favor, manda o XV parar de marcar gols, já estamos ganhando de 9X0  e nosso marcador só vai de 0 a 9, eu não tenho o número 10, nem o número 11, nem o número 12, nem merda nenhuma acima de nove.

Só risadas e gargalhadas, e a cara de pasmo do Virgílio que não entendia o motivo dos risos.

Assim é minha memória do XV de Piracicaba, nosso glorioso esquadrão que tem o folclórico e maior grito de guerra dos times do Brasil: Cáxara de forfe/Cuspere de grilo/Bicaro de pato/Gooooooor/Xv/crá, crá, crá/ Xv/crá,  crá, crá
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João Carlos Teixeira Gonçalves é professor dos cursos de Comunicação da Universidade Metodista/UNIMEP.

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