Minha primeira reação depois do susto foi a de olhar para o telhado, pois não havia nada à minha frente ou ao meu lado que mostrasse a imagem de um violinista. Talvez influenciado pelo clássico filme um violinista no telhado, do conto de Sholem Aleichem. Foi Leadbeater quem disse que as coisas de certa maneira irradiam influência no meio, e que estás, por sua vez, estão sempre retribuindo a influência – e que um pouco delas pode ser captado pelo nosso sentido físico.
Fisicamente não vejo mais o prédio que marcou minha adolescência: a casa do “Seo” Tuffi Elias – e nem mais o prédio de “O Diário”, com todo fluxo de energia explodindo de dentro para fora, impregnando quem por ali transitava. Há o prédio onde funcionava o Jornal, porém, de uma forma fria e ausente, sem o fluxo de vibração que daquele local vinha.
No telhado não havia o violinista e nem em qualquer parte do quarteirão. Porém, somente eu estava parado no meio da calçada, longe do fluxo da rua, vendo como num passe de mágica a imagem solitária e concentrada do Seo Tuffi, com a cabeça lentamente pendida sobre o ombro, a solar seu violino. Em êxtase, vejo o salão da frente de “O Diário”, todo iluminado, com uma orquestra de homens trabalhadores e cidadãos da cidade acompanhando o solo do violinista. Toda essa arrebatação, eu creio, durou alguns segundos. Porém, parece uma eternidade um espetáculo em pleno meio-dia de uma segunda-feira, quando o outono insiste em brigar com inverno.
Por isso, acredito que às vezes tocamos no invisível e que simplesmente a memória não tem sua capacidade simplesmente de rever coisas que estão enterradas no nas profundezas do passado. De uma forma ou de outra somos “Pontífices”, construtores de pontes entre o ontem e o hoje, nos permitindo a enxergar o lado oculto da cidade transformando-nos, como dizia o repórter Esso, em “testemunhas oculares da história”.
João Carlos Teixeira Gonçalves é professor dos Cursos de Comunicação da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP).