Newman Simões: um poeta de “primeira água”

Newman Ribeiro Simões promove tarde de autógrafos.

O que é a palavra, senão matéria líquida – encharcada de sentido – a infiltrar-se na língua, permeando-se em essência vernácula, a umedecer-se em sintagmas e a escorrer-se em signos? Navegante de si mesma, o que é a palavra senão elemento aquoso a vaguear pelo leito corpóreo da linguagem? À força do verbo, entre pedras de substantivo relevo, lavado por adjetivos turvos ou cristalinos, escorre o discurso dos seres em advérbios fluidos, a desembocar sonoro em seixos de frases, em córregos de orações, em ribeirões de versos, em rios de poemas. E, nesses rios (de águas tão caudalosas), descendo pelas encostas, rolando pelos barrancos, vazando pela terceira margem, navegam assim os poetas. Afinal, o que é o poeta senão um guardador de águas (nos lembra Manuel de Barros)?

E o que faz o poeta além de capinar as vagas do curso do existir daquilo que somos (se, como escreveu Hilda Hilst, somos a um tempo rio e mar)? Com que remos conduz o poeta o barco de suas (ou de nossas?) ideias? Com que braços desempenha ele o ritmo de suas menções sob a pena do movimento constante? Com que força faz brotar da fonte de seus desejos as palavras que emergem e submergem em redemoinhos de pensamentos? “Poeta de primeira água”– carinhosamente assim batizado pelo mestre amazonense Thiago de Melo – é Newman Ribeiro Simões quem nos ensina (na “violência cósmica de seu canto lírico”) que o (seu) ser poético é como um rio que corre e escoa, cria margens e fronteiras que limitam suas águas num estar sendo sem foz nem começo.

Navegador de poesias de longo curso, poeta-marinheiro premiado em diversos concursos nacionais (incluindo nessa represa de títulos o Prêmio Escriba de Poesia, em 2008), Newman Simões deixa agora que suas “águas-poéticas” venham à tona sob a forma de um livro de poemas intitulado ilogic@mente – publicado pela Jacintha Editores. Nele, o curso úmido de suas lembranças flutua sob a forma de jogos de linguagem e de sobreposições de palavras que correm rentes aos rios da prosa contemporânea da literatura brasileira. Imersa numa poesia até certo ponto raiz – que, se guarda em si o tempo das cidades do interior, tem também o seu devido ar cosmopolita –, “a ilogicamente” de Newman apresenta-se mergulhada também em inúmeras referências poéticas que, por sua vez, vão ditando, em forma de epígrafe, o ritmo das ondas líricas do livro.

Estruturado praticamente a partir de cinco seções temático-reflexivas (nomeadas como “cosmo(i)lógicas”, “etmo(i)lógicas”, “crono(i)lógicas,” “psico(i)lógicas” e sócio(i)lógicas”), e apresentando um projeto gráfico-editorial de primeira linha, não é à toa que a poesia de ilogic@mente mistura-se a de seus afluentes: despertando no leitor o gosto por desvendar as influências poéticas que parecem constituir a poesia de Newman – como, por exemplo, a notória presença de uma verve muito próxima a do próprio padrinho Thiago de Melo e Manuel de Barros. Por outro lado, se os rios do amazonas e de Piracicaba encontram-se nas paragens poéticas de ilogic@mente, impera na obra do piracicabano – todavia – o sabor das margens do interior e a atmosfera de um céu que é, no próprio dizer do poeta, um misto de silêncio cósmico e inflorescência de luzes.

ilogic@mente, assim nos chegam as primeiras águas poéticas de Newman Ribeiro Simões. Que sua poesia irrigue sempre a nossa terra, tão sedenta de boas águas.

 Alê Bragion

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Ilogic@mente

Jacintha Ediotres, 107 pp.

ISBN 978-85-60677-08

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