O tempo, que não é palpável e nem pode ser medido, faz analogia com o coelho branco da Alice no país das maravilhas. Sempre apressado à nossa frente, levando seu imenso relógio de ponteiros malucos, a gritar: “é tarde, é tarde, é tarde é muito tarde!”. Corremos loucamente atrás dele mas nunca conseguimos alcançá-lo. Não é confiável, quando chegamos perto, escapa como um peixe liso e escorregadio. Jamais conseguimos prendê-lo ou mesmo tocá-lo.
E enquanto corremos atrás do tempo, e sem que percebamos, ele vai nos consumindo. Primeiro, nos captura a infância, tão bela, fugaz que se esvai em instantes. Depois, nos surrupia a juventude, o frescor, a beleza, e vai retirando tudo até que nada mais reste além de um débil sopro de vida. E essa nívea entidade, de aparência inocente, que perseguimos tanto e tanto, e em vão, um dia nos dá o golpe final: rouba-nos a Vida!
Ah! Coelho Branco, guardião do tempo, por que nos furtas sem que ao menos possamos compreender-te?
O desfile de imagens mentais nos reporta a professoras, às primeiras letras, casa dos avós, madrinhas, tios, primos, animais de estimação, férias na praia, mas tudo se liquefaz nos tentáculos do tempo. Amores, dores, vitórias, tragédias, mágoas, alegrias, tudo se dissipa e se rompe como bolhas de sabão. Num instante são, e no outro não são, pois não existem mais.
Após sermos subtraídos de tudo, pela primeira vez, ele parece nos dizer: “Eu não vos roubei nada, correstes atrás de mim à toa. Sou apenas uma ilusão. Em vossa tresloucada corrida nem captastes o essencial. A morte é o tempo que pára.”
Só quando já não temos mais nada, é que compreendemos o mistério do tempo. Mas daí, já é tarde, a corrida foi vã, pois não nos levou a lugar algum. Como na história da Alice, onde ela anda em círculos e não sai do lugar.
Alice para o coelho branco: “Quanto tempo dura o eterno?”
Coelho branco para Alice: “Às vezes, apenas um segundo…”
Alice: “Dizem que o tempo resolve tudo. A questão é: quanto tempo?”
“Existe somente um tempo para a gente ser feliz, somente uma época na vida de cada pessoa em que é possível sonhar e fazer planos e ter energia bastante para realizá-los a despeito de todas as dificuldades e obstáculos. E esse período, tão fugaz na vida da gente, chama-se PRESENTE e tem a duração do instante que passa…”
Quando o nosso tempo se esgota, partimos, despidos de todas as vestes mundanas, de todos os laços e amarras que nos prendiam.
Livres, leves, desapegados, levando apenas fragmentos de sonhos e esperanças. E tendo a certeza de que não precisaremos mais correr atrás do enigma do tempo.
Ele nem existe.
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Ivana Negri Maria França de Negri é escritora.
A crônica acima recebeu o prêmio de melhor crônica escrita por autor piracicabano no Prêmio Escriba de Crônicas 2014.
Querida Ivana.
Adorável sua lembrança da Alice para escrever sua crônica. Ela e suas aventuras me encantaram e assombraram por muito tempo.
Sensível, como sempre, competente com as palavras, você me fez colocar esse coelho em outro patamar na minha vida.
Sábio olhar. Sábia reflexão.
Ilusão. Enigma. Para que complicar, não é? O essencial, isso sim é o que vale.E bom mesmo é procurar viver o presente da melhor maneira que for possível.
Tornemos nossos melhores sonhos realidade. Ou que permaneçam sonhos deliciosos. Eles também dão luz e cor à nossa vida.
Parabéns pela crônica. Parabéns pelo Prêmio.
Abraço com afeto.
Obrigada querida Zilma, você acabou escrevendo outra crônica a respeito da minha com seu talento natural!
bjos
Ivana, saiba de uma coisa, presente e agora: gostei demais de sua crônica.
Obrigada Milton!
Vamos viver o presente com intensidade, pois do futuro, nada sabemos…
Querida Ivana
Amei, como aprecio tudo o que você escreve, esta linda crônica.
Que venham muitas outras como esta, para que meus olhos me agradeçam ao lê-las !
Parabéns e os melhores cumprimentos pelo Prêmio Escriba do qual foi merecedora.
Meu abraço e carinho
bjs
Célia
Muito obrigada pelas palavras de incentivo Célia,a mulher do sorriso mais encantador!
bjos