Esse era o tema de um dos mais famosos livros de minha adolescência no meio evangélico. Escrito por Nick Cruz, relata o testemunho dramático de sua infância e juventude onde descreve aquilo que diz serem ações do próprio satanás. Era nesse clima que também me amedrontava, que praticava minha fé, tremendo diante de qualquer acontecimento que não pudesse ser rapidamente explicado. Desde um barulho na madrugada até alguma discordância de fatos, logo me vinha à mente que o tinhoso poderia estar por traz daquilo que não dava certo. Eu acreditava na existência de um monstro de calda e chifre, com a aparência mais tenebrosa possível, com o semblante horroroso que lembrava um bicho deformado em rosto humano. Aliás, ainda é assim que muita gente imagina o inimigo de nossas almas, um ente apavorante, de fala grossa, fétido e extremamente aterrorizante.
Na juventude, comecei a discernir melhor a imagem do diabo. Entendi que se tratava se um “ser” bem mais sutil, totalmente despreocupado em causar medo. Antes disso, seria a pessoa mais amistosa e agradável, alguém elegante e perfumado, inteligente, astuto, capaz de chamar a atenção de qualquer pessoa e até atraí-la com muita perspicácia e conquistar com toda a facilidade quem bem quisesse. Reparei que o coisa-ruim é muito mais que uma criatura, antes disso, é um sentimento, uma influência, um comportamento. Ele tem o poder de se tornar anseio, sentido, razão e emoção das pessoas. Desmaterializa-se para invadir ideias, pensamentos; materializa-se em mãos alheias para executar, forçar e exercer poder. O diabo é o sentido que norteia muita gente. Ele está nas mentes, formulando planos, está nas emoções, nas ideologias que castram a lógica, destroem a razão e cegam a sensibilidade. Porque toda ideologia que aprisiona e restringe é maligna, pois tira a liberdade e a capacidade de refletir abertamente sobre a vida e de mudar se necessário, afinal, a mudança é divina e a estagnação, diabólica.
Hoje vejo satã solto, como afirmava o livro. Cavalgando alegremente nas asas de toda maldade, indiferença, desrespeito, na intransigência de quem tem poder, na subserviência de quem serve, na arrogância, na altivez, na presunção, mas especialmente na violência e na morte. Ele não está no inferno, agora frequenta tranquilamente nossas ruas, palácios, casas, reuniões, onde tem voz e vez em muitas decisões, influenciando, aconselhando, destorcendo, mentindo, inventando, agredindo e desonrando. Ele está nos tiros, frequenta igrejas e diz amém para muitas orações.
Mesmo assim, diante da nuvem malévola que paira sobre o mundo em suas guerras e dores, sinto Deus ainda acreditando em nós, esperando a consciência fluir para que, como seres realmente humanos possamos bem alto dizer através de nossos atos, posturas e pensamentos: “Arreda-te de mim, satanás”!
Prof. Dr. Rev. Nilson da Silva Júnior é pastor e professor.