No dia 21 de março de 2020, o governador João Doria decretava a primeira quarentena em todo o estado de São Paulo. A medida, anunciada em uma sexta-feira, começaria a valer a partir da semana seguinte. Naquele período, o Novo Coronavírus já estava “dando as caras” no Brasil, mas ninguém sabia exatamente como lidar com a situação. A decisão era para evitar o máximo possível que as pessoas circulassem, numa tentativa de evitar a proliferação do vírus.
A população recebeu a notícia de forma receosa e com muitas incertezas, mas no fundo todos acreditavam que seriam apenas 15 dias e que logo tudo voltaria ao “normal”. Uma onda de solidariedade parece ter invadido o estado e o país naquele momento, com a intenção de colaborar com os pequenos comerciantes que teriam de fechar as suas portas, com os autônomos que não encontrariam “ninguém” nas ruas para vender os seus produtos ou oferecer os seus serviços, de levantar doações para as famílias em situação vulnerável, de mandar boas energias aos profissionais da saúde que estariam na linha de frente dessa batalha e tantas outras coisas boas que foram surgindo com o passar dos dias.
Em março de 2020, o discurso mais falado e escrito nas redes sociais era de que “sairíamos dessa situação pessoas melhores”. Mas o tempo foi passando e aos poucos essa frase foi esquecida e ainda pior: se transformou em intolerância, preconceito e negacionismo. Com a piora nas estatísticas de contaminação e de mortes, e a cada novo decreto de quarentena, as pessoas deixaram de lado a solidariedade e passaram a duvidar da existência do vírus que já havia matado milhares de pessoas no mundo e no Brasil.
No âmbito político, aqueles que não negaram a doença desde o início aproveitaram a situação para transformar a saúde em um instrumento para conseguir votos para as eleições municipais ou já pensando em 2022. O jovem passou a frequentar baladas clandestinas e trazer o vírus pra dentro de casa. O comerciante, quando autorizado a abrir o seu estabelecimento, “furou” as normas e lotou o seu comércio, desrespeitando o distanciamento e as medidas de higiene. A população passou a andar sem máscara nas ruas, como se o vírus já tivesse ido embora há muito tempo.
As redes sociais, que facilitaram o comércio para aqueles que aderiram às vendas on-line para conseguir o pão de cada dia, também se tornou a vitrine do ódio, da intolerância e da mais recente “cultura”, a do cancelamento. Ficou mais fácil xingar o professor, a mulher que sofre violência, o profissional de saúde, o jornalista que traz as informações à tona, ofender o desconhecido por ter uma opinião diferente.
Não deve ser fácil ser um empresário, profissional autônomo, comerciante e ter de fechar as suas portas. Não deve ser fácil ser professor e lidar com diversas turmas, até centenas de alunos, tudo dentro de casa e com poucos recursos. Não deve ser fácil conviver diariamente com o vírus nos corredores de hospitais, vendo pessoas se despedindo deste mundo a cada minuto. Não deve ser fácil exercer tantas outras profissões e outros papéis dentro da sociedade brasileira.
Mas será que realmente sairemos melhores desta pandemia? Assim como todos nós erramos, acredito que todos nós podemos fazer a nossa parte enquanto profissionais e seres humanos para que tudo passe logo, e de verdade, e leve junto todos os sentimentos ruins que predominam as falas e as atitudes. Neste momento, o egoísmo deve ser deixado ainda mais de lado. Pensar no próximo, além de ser um ato de amor e esperança, é uma necessidade.
Carol Castilho é jornalista e co-editora do Diário do Engenho.
O texto é extraordinariamente preciso na pergunta que fórmula! Ando meio desanimados com os indícios sobre a provável resposta.