Reencontro da Identidade Cultural de Piracicaba

Reencontro da Identidade Cultural de Piracicaba

Celebrar aniversário é sempre uma oportunidade de rever escolhas e se reconstruir. Voltar os olhos para o passado, em um movimento de avaliação e autocrítica, ponderando sobre os acertos e os equívocos cometidos. Projetar o olhar para frente, perspectivando novas possibilidades para um futuro mais promissor. Tal representação aparece na tradição da mitologia grega, nas narrativas sobre o deus Jano, que tem, justamente, uma face voltada para trás e outra direcionada para frente. Compreender o passado é chave para se construir um futuro comprometido com a justiça.

Na comemoração de seus 254 anos Piracicaba ainda precisa se reconciliar com sua verdadeira história, reconhecendo-se em uma identidade miscigenada e sincrética, sem medo de enxergar seu reflexo que espelha indígenas, negros e europeus. A visão de uma cidade plural, aberta a toda expressão de diversidade e profundamente democrática, forjada a partir do encontro de tantos povos – indígenas, africanos e europeus –, deve acalentar os projetos de futuro, em uma cidade edificada para o conjunto da sociedade, plena em cidadania.

Festejar o aniversário de uma Piracicaba profunda, que resiste a um perverso processo histórico, que teima e insiste em invisibilizar, nas comunidades periféricas, a sua identidade mais genuinamente brasileira. Uma Piracicaba na qual pulsa a força das tradições culturais populares, com seus ritmos, sabores, devoções e sincretismos. É tempo de recuperar e dar voz a essa Piracicaba que reflete a beleza de tantos rostos, tantos tons de pele, oriundos de todas as regiões do país.

Enquanto a cidade não se reconhecer a partir de sua plena pluralidade, relegando à sombra sua identidade mais profunda, popular e genuína, não conseguirá percorrer o caminho de integração tão urgente e necessário. Na dinâmica de democracia participativa, as contradições sociais devem ser expostas e enfrentadas com transparência. A reprodução de uma lógica de exclusão e negação identitária produzirá a intensificação das desigualdades sociais e maior desagregação no tecido social.

Como o deus mitológico Jano, na perspectiva de comemorar o seu aniversário, a cidade precisa olhar para o seu passado, com o senso crítico de justiça, reconhecendo tantos apagamentos de uma história que buscou excluir etnias e povos, dando vazão para uma limitada visão eurocêntrica. Voltar os olhos para o futuro, na disposição de construir um projeto de cidade para todos e todas, livre de múltiplas formas de preconceitos e discriminações.

A memória histórica constitui dimensão fundamental para o desenvolvimento das sociedades. Conhecer o passado, entendendo seus avanços, limites e contradições, descortina-se como condição necessária para a construção de um futuro como superação. A cidade de Piracicaba, no dia 1 de agosto, celebrou seus 254 anos. Que a data festiva possa ser também um motivo de reinvenção da cidade, assumindo o compromisso de implementar, localmente, a democracia mais plena, resguardando a todos e todas os direitos de cidadania.

 

 

Adelino Francisco de Oliveira é professor no Instituto Federal, campus Piracicaba, doutor em Filosofia e mestre em Ciências da Religião.

adelino.oliveira@ifsp.edu.br


Foto de capa: Carol Castilho.

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