O piracicabano deve sentir-se privilegiado por ter um rio que corta a cidade, por ter espaços que se dividem entre casas e prédios, mas que também abrigam árvores, passarinhos e tantos outros elementos da natureza. É bem verdade que muitos desses locais precisam de mais cuidados, de preservação e da conscientização da população, que ainda insiste em jogar lixo nas ruas, nos parques públicos e em tantos outros cantos, mas ainda assim o município é contemplado com muito “verde”, proporcionando áreas de lazer para os moradores, turistas e para todos que passam por aqui.
Pensando na conservação dessas áreas naturais, principalmente em meio a tantas notícias do agravamento das mudanças climáticas e dos seus impactos no mundo todo, o NACE-PTECA (Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão Universitária em Educação e Conservação Ambiental), com a coordenação da Fealq (Fundação de Estudos Agrários Luiz de Queiroz), que são ligadas à USP (Universidade de São Paulo), criou o projeto Corredor Caipira – Conectando Paisagens e Pessoas, que tem o objetivo de plantar 45 hectares de florestas e agroflorestas, formando corredores agroecológicos para preservar a diversidade biológica e favorecer o desenvolvimento sustentável por meio da agroecologia. A iniciativa, que conta com o apoio da Petrobras, vai beneficiar diretamente Piracicaba, São Pedro, Águas de São Pedro, Santa Maria da Serra e Anhembi e mais 13 cidades de forma indireta, incluindo Charqueada, Itirapina, Ipeúna, Botucatu, Rio Claro, entre outras.
“O projeto está atuando junto aos poderes públicos municipais, com organizações e redes locais para criação e fortalecimento de políticas públicas orientadas à sustentabilidade do território. Para a implantação dos corredores ecológicos, está sendo realizado um diagnóstico socioambiental prévio que nos permitirá encontrar áreas prioritárias para melhorar a conectividade da paisagem. Após esse cuidadoso diagnóstico, iniciaremos as tratativas com agricultores das regiões indicadas como prioritárias para buscar interessados no engajamento na proposta do projeto. Assim, definiremos os 45 hectares de áreas de restauração florestal a serem implantadas. A previsão é que os plantios sejam iniciados no segundo semestre de 2021. O projeto também possui várias frentes de ações e a parte de educação socioambiental, por exemplo, já iniciou com a oficina ‘Balaio das Mulheres’, que busca criar uma rede de mulheres atuantes na agroecologia e na cultura local”, explicou o engenheiro agrônomo e coordenador técnico do projeto, Henrique Campos.
O Corredor Caipira espera plantar mais 100 espécies de plantas durante a implementação do projeto. “Dentro desse número, destaca-se o grupo de árvores nativas da região, o que favorece a conservação dessas espécies, muitas delas ameaçadas de extinção. Parte dessas áreas serão implantadas com sistemas agroflorestais que também reunirá as árvores nativas, porém combinadas com árvores frutíferas e culturas agrícolas, o que visa garantir o provimento de serviços ambientais e também a geração de outros benefícios diretos como a produção de alimento e possibilidade de geração de renda para os agricultores e agricultoras”, destacou o pesquisador da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz) e também coordenador técnico do projeto, Germano Chagas.
A plantação de árvores e a importância delas estão diretamente ligadas com a qualidade da vida humana e animal. Elas não proporcionam apenas uma sombra ou um fruto. Elas são responsáveis por boa parte do equilíbrio do planeta. “Apesar da maioria das pessoas de Piracicaba e região viverem na área urbana, o ambiente natural proporciona inúmeros serviços que torna possível a vida na cidade. A produção de água de qualidade só é possível se tivermos a proteção das florestas nas nascentes e matas nas margens de rios. Além disso, as florestas regulam as chuvas e deixam o ambiente mais fresco e úmido”, disse o professor da Esalq e coordenador geral do projeto, Edson Vidal.
“As árvores também contribuem com o sequestro de carbono, ajudando na redução dos efeitos das mudanças climáticas. A qualidade do ar também melhora em um ambiente mais arborizado. Ressaltamos a grande relevância cultural e para o lazer das áreas verdes, que colaboram substancialmente para melhor qualidade de vida da população. Outro aspecto muito relevante na perspectiva do desenvolvimento sustentável é a conservação da biodiversidade, especialmente para as gerações futuras. Esse compromisso ético que temos com as próximas gerações é essencial para garantir a vida na Terra. Assim, conservar e restaurar o patrimônio natural é uma tarefa de todos e não podemos nos eximir dela sem consequências negativas para o futuro da nossa espécie e de nosso planeta”, complementou Vidal.
O SETOR SUCROENERGÉTIO E O MEIO AMBIENTE
Piracicaba é referência no país no cultivo da cana-de-açúcar e um dos polos sucroalcooleiros do Brasil, chamada por muitos de “Vale do Agronegócio” ou “AgTech Valley”, em referência ao Vale do Silício californiano. Atuando diretamente com o meio ambiente, como essa área tão importante para a economia local e nacional, pode contribuir para amenizar os danos ambientais? O coordenador Henrique Campos explica.
“O histórico de desmatamento na nossa região é bem antigo. As florestas foram suprimidas no final do século 19 e início do século 20. As áreas florestais naturais que restaram na nossa cidade estão fragmentadas e isoladas em pequenas manchas no meio do cultivo agropecuário, principalmente da cana-de-açúcar e das pastagens. No entanto, o maior risco atual que essas áreas sofrem é o de incêndios, especialmente porque vivemos em um cenário global de mudanças climáticas. Além disso, mesmo que não haja mais desmatamento e que essas áreas não peguem fogo, o isolamento dos fragmentos florestais e, consequentemente, das populações vegetais e animais que neles residem, com o tempo causa degradação do pool gênico dessas espécies que começam a desaparecer, gerando o declínio da qualidade da floresta para a conservação genética”.
“Nesse cenário, o setor sucroenergético pode sim contribuir para melhorar a condição ambiental da cidade. Primeiramente, o setor deve se responsabilizar pela adequação ambiental prevista na Lei 12.651/12, também conhecida Código Florestal, das propriedades onde desenvolvem seus cultivos. O setor deve restaurar os 20% de Reserva Legal e as APP (Áreas de Preservação Permanente), sobretudo nas margens dos corpos hídricos. Essa é a principal ação que deve ser tomada pelo setor sucroalcooleiro. De modo complementar, essa área pode contribuir atuando na prevenção e combate aos incêndios florestais, coibindo a ação de caçadores e contribuindo para a educação ambiental”, complementou Campos.
A CONTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO
Em suas redes sociais (Facebook e Instagram), o Corredor Caipira oferece diversas oficinas, lives, materiais informativos e ao longo do ano várias atividades devem ser desenvolvidas com a participação da população. “Contamos com o envolvimento de toda sociedade nesse processo de transformação sociocultural rumo a um território agroecológico. Vamos desenvolver atividades de educação ambiental, oficinas, cursos e ações coletivas, como plantio comunitário de árvores, limpeza coletiva das margens de rios etc e a população será convidada a participar. A preservação da natureza é responsabilidade de todos e podemos dar um passo importante mudando alguns hábitos. Quanto ao nosso consumo de alimentos, por exemplo, estar atentos à origem desses produtos e de seu modo de produção é algo fundamental. Buscar consumir alimentos produzidos na nossa região e de agricultores que se preocupam com o meio ambiente, preferencialmente produtos orgânicos e agroecológicos, contribui de maneira indireta, mas significativa, para moldarmos uma paisagem com melhores condições ambientais”, finalizou Germano Chagas.
(Foto: Rafael Bitencourt)
Carol Castilho é jornalista e co-editora do Diário do Engenho.