É preciso pensar, refletir… Talvez por influência do espírito de Natal, talvez simplesmente por não desejar se entregar assim tão facilmente… É imperativo se interrogar: por qual motivo exatamente não se constrói um mundo diferente, com outras dinâmicas sociais? A questão parece bem comum, quase pueril ou mesmo primária, mas, em que momento e por quais motivos, decidiu-se que a vida em sociedade deveria ser estruturada de maneira tão pouco fraterna, tão perversa, injusta, desigual?
Passou-se a considerar tudo como normal, quase que natural, como se outra forma de se organizar a vida não fosse realmente possível. Quando o tema é economia ou política reina apenas a perplexidade. Não se vislumbram saídas, nem alternativas. Há quem defenda que o mundo segue uma dinâmica bem razoável. Há sempre um economista de plantão, ávido para explicar porque poucos têm tanto e outros muitos ficam à míngua, à deriva, sem qualquer segurança e proteção social. Parece que é tudo tão óbvio, tão lógico, tão lúcido – tudo tão insuportável, inaceitável.
Diante de uma realidade história de opressão e injustiça, não faz qualquer sentido expressões como equilíbrio econômico ou estabilidade social. Na verdade, é preciso perguntar o que tais palavras significam de fato? Esses conceitos querem dizer exatamente o quê – diante de uma realidade que se evidencia como crescente caos social, perpetuação de desencontros e desajustes econômicos.
É mesmo inacreditável que haja certo consenso em torno da percepção de que viver é apenas isso e nada mais, de que viver é isso e pronto. Sem redundar num lugar comum, a existência tem sido paulatinamente, ferozmente, reduzida às esferas do dinheiro e do poder, não havendo espaço para esperanças, projetos, sonhos.
Se a existência pode ser tão inusitada, tão surpreendente, tomada por possibilidades múltiplas, o que nos faz aceitar, concordar que seja possível enclausurá-la, de maneira a reduzi-la e adequá-la a um modelo linear e previamente definido? Viver, de fato, se tornou raro. A grande maioria das pessoas deve se conformar em apenas subsistir. Insiste-se em negar a vida como possibilidade, desenvolvimento das muitas potencialidades, do humano como campo aberto, fortuna afetiva, derivação de uma ética criadora. O que era para ser próprio do humano talvez tenha se tornado estranho, alheio a tantas existências.
O tempo do Natal… a narrativa de um milagre divino, inspirando a se pensar outras e novas relações. Certamente é possível, é viável, é urgente a edificação de uma outra economia, outra política, outra sociedade, novas e inusitadas possibilidades para o humano, pensado como prioridade. O centro fundamental de qualquer diretriz econômica, de todo projeto política, da vida em sociedade deve ser a pessoa humana, irredutível em seus direitos, plena de dignidade, livre e autônoma.
Novamente, o tempo do Natal, tomado por seus símbolos e representações que há milênios insiste em desconstruir padrões estabelecidos de comportamento, projetos opressores de poder e modelos alienantes de relacionamentos, colocando em relevo a condição humana e o sentido último, elevado que a existência pode alcançar.
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Adelino de Oliveira é professor universitário, doutor em filosofia pela Universidade de Braga/Portugal.
Meu caro Adelino, pelo meu entendimento e crença, vivemos um momento em que o sucesso, como você bem disse, é o poder e o dinheiro que eu remeto a ganância do homem.
Albert Einstein disse: ” A terra tem tudo para prover a necessidade humana, menos a sua ganância”.
Isso, a meu ver, explica o que você disse em seu texto.
Que a Paz esteja em tua casa.
Abraços
Bertholdo
Olá, caro Bertholdo,
Você tem toda razão: a ganância é mesmo uma terrível mal. E vivemos um momento em que a própria ganância parece ter sido elevado à condição de virtude.
No final precisamos de muita inspiração para resistir a tudo isso. Talvez o tempo do Natal se companha como ocasião para revermos tantos equívocos.
Com os melhores cumprimentos,