Labirinto de pessoas – por Fernanda Rosolem

Os convites foram enviados, categoricamente. Data, horário e local agendados, aguardando a presença dos ilustres convidados.

Na pequena cidade, o assunto não poderia ser outro. Nas esquinas, nos salões, nos bares as pessoas “mexericavam” sobre os privilegiados e os excluídos deste encontro inusitado.

Custou a chegar, mas como fora impresso nos convites, no dia e horário lá estavam os convidados, e sem que se identificassem, o grande portão se abriu diante deles e lhes deu passagem para um lindo jardim.

Não era possível enxergar a casa onde o encontro aconteceria; seria necessário percorrer um labirinto verde e florido, decorado com as mais belas plantas.

 O primeiro a se aventurar no trajeto foi um jovem marceneiro. Apesar da curta idade, há muito trabalhava na profissão que seu avô lhe ensinou, e era referência na cidade. Passou pelas orquídeas, pelas bromélias e terminou no muro das trepadeiras, sem ter para onde seguir.

Ainda restavam quatro pessoas. O segundo a arriscar-se foi um jornaleiro que, tentando ouvir algo por entre as flores, algo que lhe pudesse ajudar a encontrar a saída, acabou indo de encontro a uma parede de samambaias.

A terceira convidada a iniciar o trajeto foi uma manicure. Enquanto posicionava-se para o início do labirinto, os outros dois ilustres tentavam começar um diálogo, o que, até então, não havia ocorrido entre nenhum deles

O garoto era ajudante do padeiro; o outro, um pintor desconhecido.

– Tentei conversar com vocês, mas ninguém me respondeu! – lamentou o pintor.

O garoto apenas escutou.

 – Quem você acha que passará pelo labirinto? – o pintor não desistia de começar um diálogo.

– Não sei. Nenhum deles retornou de lá. Talvez todos já tenham chegado ao outro lado. – finalmente respondeu o garoto.

Nesse momento, a manicure encontra-se com o marceneiro, diante do muro de trepadeiras.

 – Tenho uma sugestão. – declarou o pintor – Por que não vamos juntos?

 O garoto pensou por alguns instantes e não entendeu qual era a real intenção daquele homem, mas concluiu que não poderia ser má, afinal todos receberam o mesmo convite e não era para uma competição. Aceitou a sugestão.

 Os dois caminharam por entre os muros preenchidos pelas plantas,em silêncio. Vez ou outra, o pintor comentava sobre alguma espécie que encontravam pelo caminho.

 Em poucos minutos, avistaram um velho casebre. Fumaça surgia de sua chaminé e o cheiro era muito agradável. O labirinto havia ficado para trás.

– Poderia me conduzir até a porta? – pediu o pintor.

Apesar de não entender o motivo, o garoto apenas obedeceu, mas notou que havia algo estranho com aquele homem.

 – O senhor está com alguma dificuldade para enxergar? – perguntou o garoto.

– Tenha uma dificuldade que já me acompanha há muito tempo. Sou cego! – declarou.

 – Mas como conseguiu chegar até aqui? Caminhou pelo labirinto sem nenhuma dificuldade!

Com um belo sorriso nos lábios, respondeu o pintor.

 – Quando muito jovem, fui jardineiro deste lugar. Eu construí este lindo  labirinto. Depois que me patrão morreu, deixou-me este lugar como herança.

– E como consegue pintar? É difícil acreditar que o senhor seja cego.

– Apenas pinto as belezas que meus olhos um dia enxergaram!

Uma série de interrogações preenchiam a mente do jovem. E antes que fizesse qualquer novo questionamento:

– Eu tentei conversar com os outros convidados. Não entendo como um convite para um café pôde se transformar em uma disputa. Eu os chamei até aqui, pois preciso dos seus serviços. Viajarei nos próximos dias e minha esposa encontra-se um pouco debilitada para sair de casa. Preciso que o jornal e os pães sejam entregues aquiem casa. Mesmodoente, Ágata não perdeu a vaidade, por isso chamei a manicure. E por fim, meu telhado precisa de reparos..

 – Para isso, o marceneiro. – completou o garoto.

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Fernanda Rosolem é jornalista, violonista e cantora.

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