por Jean Goldenbaum
Foi realmente emocionante assistir Lula sair da prisão. Um momento distinto, daqueles que ficam marcados na história, e sobre o qual poderemos contar para as próximas gerações que assistimos ao vivo. Lula parece jovial tanto fisica- quanto mentalmente, com seu carisma em nível máximo e até seu conhecido ocasional humor. Beijou a noiva, falou de amor e até de tesão, reafirmando repetidamente sua gratidão a todos que fizeram parte do ativismo #LulaLivre e principalmente da vigília em frente à polícia federal onde estava preso. É de fato uma figura ímpar, e provavelmente o maior líder político que o Brasil já teve. E todos os que, cada qual à sua maneira e possibilidade, lutaram por sua liberdade – e aqui me incluo com satisfação –, de certa forma lavaram suas almas ao atingir uma primeira vitória após tantas derrotas políticas, desde a ascensão do Neonazifascismo no Brasil.
Dito isto, passada a euforia da vitória, o êxtase da liberdade e o júbilo da justiça, já é hora de nos perguntarmos: e agora? Eu me fiz esta pergunta ao acordar hoje de manhã (09/11/19) aqui na Alemanha, onde vivo, enquanto a maioria dos brasileiros ainda dormia, ou nem tinha ainda ido dormir graças às merecidas festividades.
Tenho a minha resposta e dividirei com o(a) caro(a) leitor(a), para que possamos todos juntos articular estas expectativas. Pois bem: o que quero é acima de tudo um Lula extremamente combativo. Sim, um Lula que não poupe agressividade ao inimigo. Que não se acanhe em chamar fascismo de fascismo e fascistas de fascistas. Lembram-se da época em que o chamaram de “Lulinha Paz e Amor”, no início do milênio? Pois é, era adequado naquela época. Mas não é hoje, afinal José Serra nem por um milhão léguas chega perto do horror que representa o atual presidente do país. Hoje necessitamos de Lula como símbolo de contenda, de confronto ao Neonazifascismo que domina o país. É a única maneira de batermos de frente com um inimigo como este, que joga tão sujo e baixo, e cujas armas se resumem a disseminação de mentiras e incitação de ódio.
Nos EUA – país que vive situação terrível política, mas ainda assim não tão catastrófica como o Brasil – a nossa luta enquanto ativistas é obviamente expulsar o clown da extrema-direita que embaraça a Casa de Branca desde 2016. Sobre esta batalha, o cineasta e ativista Michael Moore (que produziu obras geniais como Bowling for Columbine, Fahrenheit 11/9 e The Awful Truth) disse há algumas semanas: “Para batermos Trump no ano que vem, precisamos de um ‘street fighter’, um verdadeiro lutador. E não algum político qualquer que não saiba lutar a altura do adversário.” Ele tem absolutamente toda a razão. Não estamos em épocas civilizadas em que Lula, Dilma, FHC, Serra e cia. disputavam o poder nacional. Estamos lidando com a barbárie e com o mais avassaladoramente disruptivo presidente da história do Brasil, que vem desconstruindo não somente a Democracia, mas a sociedade e a cultura brasileiras como um todo. É necessário atacar sem parar e reunir para este ataque todas as dezenas de milhões de brasileiros e brasileiras que estão do lado da Democracia e contra o Neonazifascismo. Nosso líder estava preso. Ficamos claramente sem um guia. Haddad, por mais competente que seja, não deu conta. Ninguém daria. Mas Lula agora está livre. E é hora de ele se mostrar em sua melhor forma.
Mais especificamente em três pontos, este é o caminho que espero que Lula siga:
- Fale uma única vez e de uma vez por todas em nome do PT sobre os erros que ocorreram, assumindo a corrupção feita por muitos membros do partido. Isso não caracteriza fraqueza, mas muito pelo contrário. Significa força e segurança. Mencione que governos do PSDB tiveram tanta corrupção quanto, mas isto passou batido. Lula é inocente, mas há gente no PT que não é. Então diga que se compromete a caçar e expulsar do partido todos os que não honraram o nome e o significado de um partido desta grandeza e nobreza de princípios. E que no futuro, erros do passado não ocorrerão. Ponto final sobre o tema ‘corrupção’. Bola para frente.
- Seja a força unificadora de todos os partidos de esquerda, centro-esquerda. A fragmentação só fortalece o inimigo. Faça o que sempre fez tão bem e dialogue com quem for possível dialogar. Mesmo nos blocos centrais deve haver também quem esteja disposto a se opor à extrema-direita. Se há alguém que pode unir e reunir estas forças, é Lula.
- Comece já a combater o presidente nas áreas em que este é mais perigoso e maléfico: Direitos Humanos, Ambientalismo e Justiça Social.
Se tornando um defensor dos Direitos Humanos, Lula se colocaria como a antítese do presidente. Não deixe os negros, os índios, os LGBT+ sem amparo. Não deixe de ir atrás até o final do caso do assassinato de Marielle.
Com relação ao Ambientalismo, o Brasil, como pai da Amazônia, precisa de alguém que represente nacional- e internacionalmente uma oposição aos ultradireitistas que escarram no meio ambiente e negam verdades científicas como o fenômeno do aquecimento global. Lula poderia se tornar um símbolo mundial desta defesa. Polos como Europa e EUA atentam demais para esta questão. E o apoio estrangeiro a Lula seria muitíssimo importante. Ainda mais considerando o fato de que líderes equilibrados e conscientes já abominam o atual presidente brasileiro e sua política.
E a questão da Justiça Social, é a causa de sempre de Lula. Fazer o pobre menos pobre. Fazer a sociedade menos desigual. E isto deve ser luta perene.
Estabelecida esta postura, penso que Lula deve se comportar como o líder mundial que ainda é. Ele muito possivelmente teria vencido as eleições, sabemos disso. Por isso deve agora começar a “governar” da maneira que pode, com o apoio popular e a reputação (no Brasil e no mundo) que ainda tem – e que não é pouco. Aja como presidente, converse com líderes internacionais, com quem teve sempre ótimas relações. Monte um exército de advogados para conseguirmos a anulação das eleições de 2018, afinal elas foram fundamentadas em ilegalidades e fake-news. Havá briga? Sim, muita. Mas já estamos muito a fundo neste mar de ódio. Agora é hora de não termos medo algum de brigar. E vamos começar tudo de novo. Pois esta catástrofe que está ocorrendo no Brasil, se não for interrompida, fará estragos irreparáveis às muitas gerações por vir.
Enfim, é isto o que eu gostaria de ver e ajudar a realizar. Ocorrerá? Não sei. Temo que Lula tome uma postura morna, visando construir um candidato petista para 2022 ou algo assim… (lembrando que, ao menos por enquanto, ele próprio não pode concorrer em eleições).
Espero que ele compreenda que estamos vivendo os tempos mais sombrios da história brasileira desde a ditadura (tão elogiada pelo nefasto presidente e os seus). E espero que Lula seja aquele que coloque fogo revolucionário no Brasil, pois somente através de muita energia veremos o país se recuperar deste ataque extremista e fundamentalista que vem diariamente acabando com a Democracia, com o Estado de Direito e com tudo o que os seres humanos decentes querem para si e para seu próximo: Liberdade, Respeito, Igualdade e Justiça.
Força, companheiro Lula. Afinal, agora, mais do que nunca, contamos com você.
Dr. Jean Goldenbaum é compositor e musicólogo, professor do Centro Europeu de Música Judaica da Universidade de Música, Teatro e Mídia de Hannover, Alemanha. Ativista político e social, é um dos membros fundadores e coordenadores do ‘Observatório Judaico de Direitos Humanos do Brasil’ e faz parte do grupo ‘Resistência Democrática Judaica’.
Maravilhoso