Direito e Justiça na Pandemia: o drama das professoras em Piracicaba

Direito e Justiça na Pandemia: o drama das professoras em Piracicaba

A pandemia impôs à sociedade muitas perdas. A doença, suas sequelas e, no limite, a morte trouxeram dores, impedindo que a vida cotidiana seguisse seu fluxo mais normal. O isolamento social tem sido uma necessidade e também uma importante estratégia para conter, minimamente, o avanço do ciclo de contágio da Covid-19 e de suas variantes. Todos os setores produtivos e de serviços foram impactados pela pandemia. Nesse cenário, a atuação do poder público, com políticas públicas de assistência, auxílio e amparo, é fundamental e imprescindível para responder e enfrentar as várias demandas sociais que surgiram ou mesmo se intensificaram.

A educação foi profundamente afetada, alterando a rotina de toda comunidade educativa e trazendo prejuízos enormes ao processo de ensino-aprendizagem. Como se mensura as perdas na área da educação? Qual o caminho para se minimizar tantos prejuízos? As aulas remotas apresentam muitas dificuldades e exigências específicas para cada seguimento educacional. Cabe ao poder público equacionar tais dificuldades, dando condições materiais, tecnológicas e emocionais tanto para os educadoras quanto para os estudantes e suas famílias.

Aqui é importante indagar: o que a prefeitura efetivamente fez na área da educação para que os prejuízos ao processo de ensino-aprendizagem fossem mitigados? Quais projetos foram implementados na educação para o enfrentamento da pandemia? Compra de tabletes para os estudantes? Garantia de conectividade por meio de acesso gratuito à rede da internet? Abertura de linha de financiamento para aquisição de equipamentos tecnológicos para o conjunto de educadores? Acompanhamento com profissionais das áreas da psicologia e psicopedagogia para dar suporte emocional à comunidade educativa? O que a prefeitura colocou em prática como política pública em prol da educação na pandemia? Esse é um debate que a cidade precisa fazer.

O seguimento da educação infantil traz muitas especificidades. Como fazer o isolamento social em um contexto formativo no qual a interação presencial é um elemento pedagógico imprescindível? Em um cenário de pandemia, com muitos contágios, como a prefeitura organizou a escola para proteger tanto os educadores quanto os alunos? E quando os professores e professoras, na dinâmica do exercício do magistério, ficavam doentes, com Covid-19, o que a Prefeitura vislumbrou quanto a isso?

O abono assiduidade é um instrumento de gestão criado para garantir e estimular a presença cotidiana das professoras, sem faltas, sem ausências. Mas a Covid-19 impôs as ausências, até por uma questão de consciência social, para não se disseminar ainda mais o Coronavírus e suas variantes. Como considerar a questão da assiduidade se a professora contraiu Covid-19 na escola, exercendo suas responsabilidades pedagógicas? É justo que a professora que pegou Covid-19 na escola, mediante o pleno exercício de suas funções profissionais ou mesmo que tenha sido obrigada a se isolar, ausentando-se do ambiente escolar, por estar com suspeitas de Covid-19, seja duplamente punida perdendo o direito ao abono por assiduidade? Punida em sua saúde, pela pandemia; punida também economicamente, pelo corte em seus vencimentos.

A pandemia coloca a sociedade diante de um problema ético, de justiça. É justo perder direitos em uma realidade totalmente fora da normalidade? É justo cobrar assiduidade quando se exige, pelo bem da saúde pública, o isolamento, a não presença? É evidente que ninguém fica doente voluntariamente. Mas quando a doença é adquirida no próprio ambiente de trabalho, por uma necessidade imperiosa de manter atividades presenciais, não considerar a especificidade do momento histórico não é apenas injusto como também perverso.

É preciso o debate público e a participação da sociedade civil para refletir temas e garantir os direitos fundamentais das educadoras, que são trabalhadoras, com rendimentos limitados, que sofrem com as oscilações do mercado. São agentes essenciais na dinâmica de formação para a cidadania e garantidoras do processo civilizatório. Tamanha sua relevância que negar o abono assiduidade, em decorrência do imperativo de uma ausência por estar com Covid-19, pode caracterizar uma violação de princípios constitucionais e subversão da ordem democrática. Neste contexto, o poder público deve negociar e ser o principal defensor do primado do direito, da justiça, sob pena de esvaziamento de sua autoridade e legitimidade.

 

 

Adelino Francisco de Oliveira é professor no Instituto Federal, campus Piracicaba, doutor em Filosofia e mestre em Ciências da Religião.

adelino.oliveira@ifsp.edu.br

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