A História – com H maiúsculo – é implacável. Seu registro atemporal não tolera a pós-verdade, as “fake-news” ou mesmo a narrativa fabular e mítica dos alienados ou dos intolerantes que comungam dessa ou daquela ideologia. Nem mesmo revisionistas dementes conseguiram – nem conseguirão – apagar a História e seu registro série, científico, acadêmico. Podem os ensandecidos duvidarem dela, podem os ideólogos de plantão quererem adulterá-la, podem os criminosos de colarinho branco e caneta bic nas mãos quererem recontá-la a seu proveito, que enquanto houver sobre a Terra um historiador sério capaz de – labutando no campo neutro da ciência e da pesquisa científica – registrar a História – mesmo ameaçado mortalmente pelas mãos de ferro de um estado de exceção -, ela se fará presente para todo o sempre.
Os revisionistas da Segunda Guerra Mundial se esforçam até hoje para recontar a história do nazismo a fim de absolverem os vermes nazistas de seu crime contra a humanidade. Conseguiram? Felizmente, não. Grande parte da burguesia branca e racista do Brasil tenta há décadas reescrever o passado escravocrata da nação, mas sem êxito. Os EUA também se esforçam diariamente para fabricarem uma história que os coloque como heróis da humanidade e os purifique de seus crimes contra o mundo, mas a história continua registrando suas atrocidades e seus crimes travestidos de combate ao terrorismo, ao “mal” sempre por eles inventado. Mesmo a esquerda também se esforça para criar uma narrativa histórica que transforma ditadores e estados de exceção em atores fundamentais para – ora vejam – a promoção da paz, dos direitos e da liberdade. Todavia, diante da história não há estados de exceção. Seu registro ainda é a principal fonte para se entender o mundo e sua memória.
Quando falamos de história – História – não estamos aqui falando de narrativas particulares, não estamos aqui nos referindo a registros pessoais, partidários, pertencentes a esse ou a aquele grupo. Muitas vezes, erroneamente, ouve-se por aí que a história é contada por quem sobrevive, pelos vitoriosos de embates e batalhas sangrentas. Porém, essa não é a história a qual nos referimos – e a qual acreditamos sempre sobreviver. Quando falamos em história, estamos falando em pesquisa, em estudos acadêmicos, em registro e formulação de tratados e teses que se formulam a partir de provas – primárias ou não – e se fundamentam no campo da ciência histórica. E, dessa história, ninguém escapa.
Dito isto, e diante das atrocidades cometidas em relação à democracia brasileira do ano de 2016 para cá (e acentuadas a partir do processo da Lava-Jato), nos cabe agora a pergunta retórica: de que lado você, caro leitor, está? Quando os livros de história, num futuro não tão distante, passarem a contar e a registrar os tempo tenebrosos que vivemos, qual será – caro leitor – o seu lugar nessa narrativa? Está você ao lado das leis, da justiça neutra e realmente “justa”? Ou estará o leitor deste editorial ao lado daqueles que acreditam que os fins justificamos meios? Estará na história você, leitor, ao lado daqueles que entendem que a democracia – com todos os seus problemas, ônus e bônus – deve ser protegida e resguardada a qualquer custo ou estará você, leitor, ao lado daqueles que (entre certos procuradores, criminosos juízes, policiais obscuros, corruptos políticos e outros) rasgam a Constituição e reinterpretam ao bel prazer as leis que regem a nação a fim de fundarem um jogo de poder em benefício dos poderosos e de partidos que, democraticamente, não conseguem mais chegar ao poder?
De que lado está você, caro leitor deste humilde diário desta nação colônia, deste engenho chamado Brasil (ou deveríamos grafar “BraZil”?)?
Desde sempre, nós, do DE, sabemos como queremos entrar para a história – para a humilde história do cotidiano ao qual pertencemos. Desde sempre, sabemos que – em hipótese alguma – nós abriremos mão da defesa da democracia, do exercício cotidiano da liberdade pautada no respeito ao próximo, da luta constante pelo prevalecimento das leis e da justiça “de fato” – independentemente de quem seja o réu ou sobre quem ela, com equidade e justeza, recaia.
Como dissemos, a nossa pergunta é retórica – pois sabemos que você, leitor, que nos acompanha aqui também comunga conosco desses mesmos ideais. Afinal, se assim não o fosse, dificilmente teríamos a satisfação de sua leitura frequente. Todavia, e ampliando a questão, retomemos: de que lado está a nação brasileira e suas instituições, neste momento? Caminha ela ao lado de juízes injustos? Comunga ela com atrocidades (i)legais travestidas? Absolve ela aos algozes dos direitos e da democracia?
Está o Brasil, talvez, diante de sua maior encruzilhada histórica. O posicionamento de sua gente, de seus cidadãos, deixa hoje marcas em alto-relevo e que serão lidas, relidas e contadas pela história a ser narrada num muito breve amanhã. E o registro do que hoje faz a nação e de como ela caminha em seu cotidiano, infelizmente, talvez mude a “cara” e o “espírito” que o mundo credita ao brasileiro até agora.
Infelizmente, a olhos vistos, nossa nação parece revelar sua verdadeira essência, sua verdadeira face – e a história não nos poupará o seu registro e nem nos absolverá por nossas escolhas.