De tempos em tempos, pergunto-me sobre a essência e afetações do coração militante. O que é ser militante, qual a sua natureza, o que esperar de suas ações, o que realmente deseja? Qual o lugar e peso da militância na atual fase da luta política prolongada? Outro questionamento central, como exercer a militância, em uma dinâmica de cidadania ativa, livre de qualquer desvio clientelista?
É preciso ressaltar, desde logo, que, no contexto atual, a militância é tarefa urgente e necessária. Militância para enfrentar o neofascismo, para combater desigualdades, para defender, de forma aguerrida, as bandeiras que possam garantir o processo civilizatório. Os tempos obscuros fomentam um agir militante cheio de coragem, empatia e espírito revolucionário. O militante é aquele que defende ideias e projetos, propondo novas formas do fazer social.
No período do regime militar e no processo de redemocratização da sociedade brasileira, conhecemos muitos militantes, ganhando o tema maior envergadura e visibilidade: jovens, mulheres, intelectuais, trabalhadores rurais, operários, dentre outros, passam a compor a luta política. Muitos deles organizaram movimentos sociais, morreram, lutaram, estiveram na linha de frente, defendendo garantirias sociais, civis e políticas. Foram os grandes heróis que construíram nossa democracia, hoje tão aviltada por autoridades governamentais e o pensamento autoritário, a demonizar a diferença, a diversidade, o debate de ideias e a pluralidade.
O legado daqueles que construíram a luta política continua intenso e se articula, inspirando uma nova militância, com novas e mais contemporâneas práticas e linguagens. Jovens, mulheres, comunidade lgbtqia+, negras e negros, ambientalistas, povos indígenas, artistas cantam a pluralidade de um embate que deseja uma sociedade sustentável com tons de igualdade. Há muitos espaços para uma nova militância, uma outra sociabilidade que se comunica com diversas tecnologias, a rapidez da circulação de informações, uma inventividade que integra cores e muitas manifestações artísticas e culturais.
Fato que a militância e os militantes se reinventam e se organizam no campo progressista e da esquerda. Geralmente, são os mais empenhados, criativos, argutos e sagazes, prontos para desmascarar e destrinchar a opressão que nasce das práticas do conservadorismo odioso. Interessante notar que esta tendência exige um coração militante, livre, sem amarras, distante das burocracias e de um regramento enfadonho, muitas vezes circunscritos de maneira contraditória, às próprias organizações do campo da esquerda.
E, principalmente, este coração militante é honesto com seus princípios, valoroso na construção coletiva, independente e audacioso. Não aceita pagamento e se embrenha na luta pelo projeto e pela transformação que lhe trará um conforto e a garantia da missão cumprida.
Num mundo que assiste ao avanço de uma leitura conservadora, que tende a aniquilar as diferenças, aquele que milita terá desafios e enfrentamentos que lhe exigirão abnegação, certo altruísmo e o sonho revolucionário. O horizonte é amplo, os medos são muitos, as opressões querem intimidar e coagir. Mas a alma militante age como sentinela: observa, recompõem estratégias de luta, transforma, encoraja. Trata-se de um personagem fundamental na história e na construção de uma outra ordem social. O coração militante é profundamente revolucionário – saibam disso!
Maria Teresa Silva Martins de Carvalho é assistente social.