Os ataques não sem preconceitos, as análises cheias de ressentimento, o debate embasado em uma fraca teologia, a ausência de empatia e caridade nas abordagens e a forte recusa ao tema da Campanha da Fraternidade 2021 só evidenciam a grande pertinência e até a urgência da linha de reflexão proposta pelo Conic, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs. Talvez esteja faltando, justamente, um olhar de fraternidade a começar por alguns seguimentos das próprias Igrejas cristãs.
Tentando descontruir a Campanha, foram explicitadas as mais diversas acusações, tendo como cerne a negação de sua dimensão colegiada, que refletiria um certo consenso pastoral entre as Igrejas que compõem o Conic. É relevante frisar que esta é uma campanha ecumênica, elaborada a partir do diálogo e do encontro entre Igrejas cristãs, em um nobre e bonito propósito de se promover unidade. A busca por unidade é, inclusive, uma perspectiva central da mensagem cristã.
O termo ecumênico provém da palavra grega οἰκουμένη (oikouméne) e significa mundo habitado. Em um sentido mais restrito e pastoral, emprega-se o termo para os esforços em favor da unidade entre as Igrejas cristãs. Assim, a expressão ecumenismo remete a uma unidade construída em torno de um ponto comum. No caso do Conic, as Igrejas cristãs que se unem para a composição da Campanha da Fraternidade, elegendo, a cada cinco anos, um tema relevante e sensível para a vivência cotidiana da fé cristã.
Do ponto de vista pastoral, a Igreja Católica compreende como uma das dimensões fundamentais de sua missão trabalhar para a unidade entre os cristãos. O ecumenismo é entendido como uma maneira de se testemunhar a própria fé em Jesus Cristo. Ao longo de sua história o cristianismo realizou muitos Concílios Ecumênicos, buscando sempre assegurar e construir a unidade, como um símbolo fundamental do discipulado de Jesus.
As dificuldades para se chegar a uma unidade dogmática são grandes e múltiplas, pois envolvem profundas concepções teológicas de fé. Por isso, é mais plausível construir o caminho de diálogo e encontro entre as Igrejas a partir de desafios pastorais, que são comuns, na medida em que refletem a realidade do mundo no qual as Igrejas se encontram inseridas. Qual a resposta cristã, sempre à luz dos valores do Evangelho, aos dramas do mundo?
A Campanha da Fraternidade de 2021, que traz como tema “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor” e como lema “Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade”, propõe um olhar teológico pastoral sobre a realidade das minorias sociais, atualizando – por meio de uma hermenêutica crítica, problematizadora e profundamente enraizada no Evangelho – o grande desafio cristão de construir uma nova sociabilidade, alicerçada no diálogo, na inclusão, no encontro fraterno e na paz, tendo como cimento de unidade o princípio básico do mandamento do amor.
As discussões e debates em torno da Campanha da Fraternidade apenas atestam a pertinência e relevância de sua proposta. Se de fato é preciso edificar a sociedade a partir do mandamento do amor, superando formas arraigadas de preconceito, racismo, discriminação e exclusão social, como propõe a Campanha, fica também evidente a urgência de se reconstruir o campo de diálogo entre os próprios cristãos, retomando os caminhos pastorais do ecumenismo, para que todos vejam, na unidade entre cristãos, o autêntico testemunho de amor.
Adelino Francisco de Oliveira é professor no Instituto Federal, campus Piracicaba, doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião.
adelino.oliveira@ifsp.edu.br