A intolerância, a ameaça e a violência não podem ser toleradas como métodos de ação política, pois representam risco inaceitável à democracia. No Brasil, infelizmente, os sinais de escalada da violência são a cada dia mais frequentes e devem servir de alerta a todos os que presam pelo diálogo e pela liberdade de pensamento e expressão.
Três episódios recentes, todos muito graves, são sintomáticos desta situação: os ataques perpetrados contra a médica Ludhmila Hajjar, a investigação aberta contra o youtuber Felipe Neto, com base na Lei de Segurança Nacional, e a ameaça pública, em rede social, de morte ao ex-presidente Lula.
No caso da médica Ludhmila Hajjar, cardiologista renomada, os ataques se iniciaram após sua indicação, por parlamentares do Centrão, para ocupar o Ministério da Saúde. Antes mesmo de se reunir com o presidente Bolsonaro, passou a ser alvo de milícias digitais, por meio da falsificação de perfis e postagens, recebeu ameaças de morte, teve seu número de telefone celular exposto e houve inclusive tentativa de acesso a ela no hotel em que estava hospedada em Brasília.
O motivo dos ataques: a profissional, em sintonia com o conjunto das entidades médicas e sanitárias do país, e com todas as pessoas informadas e de bom senso, defende medidas como o isolamento social, o uso de máscara e álcool em gel, e a vacinação em massa da população. Naturalmente, o convite para o Ministério (depois negado pelo Governo), não foi aceito, por divergências técnicas com o estabelecido pelo Governo.
O youtuber Felipe Neto, que durante muito tempo foi crítico ferrenho do PT, foi chamado a depor na Delegacia de Repressão a Crimes de Informática da Polícia Civil do Rio de Janeiro. O inquérito foi aberto a pedido do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) e o influenciador é suspeito do crime de calúnia, com base na Lei de Segurança Nacional, por ter chamado o presidente Bolsonaro de genocida.
Já o ex-presidente Lula foi alvo de ameaça feita por meio de publicação em rede social. No vídeo, agora objeto de investigação, um homem vestindo camiseta do Brasil e portando a bandeira do país enrolada na cintura, faz disparos e, dirigindo-se a Lula, aponta para a arma e diz que o presidente “vai ter problema”.
As tentativas de intimidação ocorrem no ambiente das redes sociais, por meio de verdadeiras milícias digitais, e pela mobilização de setores da polícia e legislação da época da ditadura. O pensamento diferente é confrontado com violência e essas ameaças não devem ser ignoradas, pois o assassinato, até hoje não solucionado, da vereadora Marielle Franco, é demonstração clara de que podem se tornar realidade.
Este ambiente de ataques ao Estado Democrático de Direito não contribui em nada para o enfrentamento da pandemia da Covid-19, que todos os dias tem tirado a vida de milhares de brasileiros. Ao contrário, só dificulta o posicionamento de autoridades que defendem uma ação centralizada, organizada e sintonizada com as orientações da ciência.
É urgente, pois, frear esta extrema direita de corte fascista que vai aos poucos ganhando corpo no país.
Paulo Roberto Botão é jornalista e mestre em Comunicação Social.