A vida é a arte do encontro

A vida é a arte do encontro

Na última sexta-feira (10/5), por conta de um encontro com um amigo que há anos não via, e que atrasou (problema inesperado de saúde na família), não compareci à abertura da exposição “Escultura em dose dupla: dois amigos que se encontram na arte”, no Espaço Cultural da Biblioteca da FUMEP. Uma escolha “agridoce”.

Tivesse ele mais tempo, iríamos juntos à exposição que até no nome tem “encontro” – e eu encontraria os “dois amigos que se encontram na arte” – o Francisco Constantino Crocomo e o Arayr Olair Ferrari (o Chico e o Ferrari) que se encontram na escultura, na arte, na vida – que é a arte do encontro, no dizer de Vinicius. Encontraria, ouviria o Alexandre Bragion e a Fernanda Rosolem, que na arte se encontram também.

Encontraria o bibliotecário Guilherme Belíssimo, que conheci nas reuniões para elaboração do Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas, PMLLLB (aproveitando, a proposta do plano foi entregue em outubro do ano passadohttps://m.camarapiracicaba.sp.gov.br/vereadora-entrega-plano-municipal-do-livro-ao-prefeito-62825, à quantas anda?), a professora da EEP, Maria Helena Tavares, que também conheci no mesmo esforço pelo PMLLLB. Encontraria os familiares do Chico, do Ferrari e tantas outras pessoas que vi nos vídeos e fotos que recebi. Uma destaco: o professor Francisco falando a seus estudantes– o que mudou em seus olhares ver o professor em uma biblioteca, expondo e conversando sobre seus trabalhos em madeira? Como o veem agora?

Mas o “poetinha” sabia das coisas: “a vida é a arte do encontro/Embora haja tanto desencontro pela vida”. E desencontros evito, se evitáveis são. E nesses evitáveis de que quero distância, eu não teria ido ao Engenho Central, na “reabertura da Pinacoteca Municipal Miguel Archanjo Benício D’Assunção Dutra”, na mesma noite de sexta-feira. E não seria por birra, antes fosse, uma hora passaria.

A “Pinacoteca” ficava no jardim da nossa infância, das brincadeiras. Com palitos de fósforo que encontrávamos, “tecíamos” cocares, utilizando-os para juntar folhas. Construída em 1968, inaugurado no ano seguinte, não saberia dizer quantas vezes meu pai desceu-subiu as ladeiras e rampas frequentando-a, participando dos salões, escrevendo sobre eles. Não saberia, talvez devesse ter anotado, faria diferença? Acho que não, nem os apelos – o abraço ao prédio conseguiu emocionar, fazer refletir.

Não, eu não iria ao desencontro da “reabertura da Pinacoteca”, e não seria por birra. Como ouvir nos discursos a palavra “moderna”, no “argumento” para justificar a mudança de local? Quem deu o direito a essa palavra de “zerar” a história das pessoas, das obras, das exposições que se juntaram ao lugar? Na tragédia “Júlio César”, de W. Shakespeare, quando Cássio pergunta a Brutus se pode ver o próprio rosto, ele responde: “Não Cássio; o olho a si mesmo não se enxerga, senão pelo reflexo em outra coisa”. Então, não seria por birra –é que desfigurar a cidade me impede de ver meu próprio rosto refletido “em outra coisa” que vivi.

Não, não seria por birra, antes fosse, uma hora passaria.


 

Sergio Oliveira Moraes é físico e professor aposentado ESALQ/USP

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