A Imagem Teologal de Maria e a Proteção às Crianças

A Imagem Teologal de Maria e a Proteção às Crianças

Sempre me intrigou a proposta do dia 12 de outubro, que une e conecta duas comemorações aparentemente distintas. O feriado coloca em perspectiva a celebração de Nossa Senhora Aparecida e também o dia das crianças. Concepções teológicas e políticas destacam-se como instrumentos para a construção de convergências profundas, que podem ser estabelecidas entre os motivos centrais dessa data celebrativa.

Na tradição do cristianismo a figura de Maria sempre despertou fascínio e admiração, ocupando um lugar emblemático de relevância, respeito e grande autoridade, mesmo entre os cristãos não católicos e até entre os não cristãos. Nos relatos dos Evangelhos, Maria é reconhecida como a Mãe de Jesus Cristo, o filho de Deus. Os estudos teológicos têm avançado muito na compreensão do papel das mulheres no interior do movimento de Jesus, tendo Maria como modelo de discipulado e liderança.

A questão da infância passa a ser motivo de grande preocupação especialmente em uma realidade tão profundamente marcada pela carência de direitos, que tem relegado tantos brasileiros a uma perene situação de pobreza, compondo uma vida sem perspectivas nem oportunidades. Nesse contexto, torna-se urgente proteger a infância, período fontal para o florescimento de uma existência cheia de sentidos e tomada por múltiplas possibilidades.

Na cultura hebraica, o nome Maria é Miriam, que significa senhora, sabedora. A partir de seu nome de missão, as passagens bíblicas sempre apresentam a figura de Maria tomando decisões firmes e plenas de sabedoria. Em cada contexto histórico específico, a representação de Maria passou a assumir e realçar certas características capazes de inspirar e oferecer alento. A mariologia, como disciplina teológica, tem feito o esforço de sistematizar qual o lugar de Maria na revelação cristã. Em uma hermenêutica mais popular, Maria passou a ser símbolo de cuidado, proteção, força, sabedoria e fonte do mais profundo afeto. Há estudos e representações que avançam para entender Maria a partir de uma perspectiva de luta e de transformação social.

Celebrar Maria e sua conexão com o universo infantil, a partir de um olhar histórico, remete-nos a pensar a construção de políticas públicas capazes de dar materialidade ao que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente. A proteção à infância é tarefa de toda a sociedade. Todos são corresponsáveis pelo cuidado e formação das crianças. É preciso que a sociedade articule um vasto movimento em defesa da infância, exigindo políticas públicas que garantam os direitos fundamentais para a plena vivência dessa tão importante fase do desenvolvimento humano.

Desde o processo de colonização, em uma história sempre marcada por situações de sofrimento e abandono social, o povo brasileiro tem identificado em Maria um sinal de acolhimento e amparo. As dores do povo encontram em Maria a possibilidade da justiça e de um efetivo direito. Por isso que Maria passou a ser designada como a sublime advogada, aquela que intercede por seu povo, promovendo toda justiça. A defesa e o resguardo da infância como condição primeira do processo civilizatório devem estar na pauta daqueles que celebram Maria, promovendo posturas coerentes, sensíveis e transformadoras.

Maria tornou-se o arquétipo da mãe que gesta, cuida e protege a vida. A conexão com o dia das crianças – para muito além de uma data meramente comercial – acaba ficando mais do que evidente. Há um apelo teológico, mas também social e político, para que a sociedade, espelhada em Maria, seja despertada para ações que cuidem, protejam e acalentem as crianças, garantindo o direito à infância em uma vida aberta para um mundo de possibilidades. Que a fé em Maria, que acalma e enternece tantos corações pelo Brasil, seja também a base para uma sociedade realmente comprometida com o cuidado e a proteção de todas as crianças, garantindo que a vida possa florescer como o dom mais sagrado.

 

 

Adelino Francisco de Oliveira é professor no Instituto Federal, campus Piracicaba, doutor em Filosofia e mestre em Ciências da Religião.

adelino.oliveira@ifsp.edu.br

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