A Benção do Lugar

A Benção do Lugar

MahandomeDizem os sufis que quando viajamos buscamos, além do divertimento, a Báraka do lugar visitado.  Isto é, em todo lugar existe uma energia que nos renova e nos ajuda viver. É óbvio que não basta simplesmente viajar ou simplesmente mudar de lugar para se conseguir obter essa benção chamada Báraka. É necessário querer entender o funcionamento e ter consciência de, uma vez operada essa transformação no lugar visado, saber trazê-la para o seu lugar de vivência.

ChiQuando visito os lugares vividos de minha infância, procuro sentir a energia existente e, conscientemente, tento trazê-la para meu universo interior e aí cambiá-la de forma a senti-la interiormente e a transformá-la em Báraka. Na minha infância, na Rua Alferes José Caetano, próximo ao grupo Moraes Barros (Centro), sempre amei e curti o cinema. As minhas brincadeiras com os amigos eram com luz, lente e uma caixa de sapatos improvisada para projetar nossos filmes adquiridos dos projetistas do Cine Colonial, do Cine Politeama e São José (o Zelão), que nos forneciam pedaços de celuloide de películas quebradas durante a projeção. Também os desenhava em tiras de papel celofane branco e os projetava na parede, como obra de nossa criação.

A curtição era tanta que uma vez escrevi para Walt Disney pedindo orientação para produzir filme de desenho animado. A carta levou um ano para ser respondida e, certo dia, quando já havia esquecido dela, o correio chegou trazendo a resposta dos estúdios Disney. Não era instrução de produção, porém era um agradecimento a mim por tê-la escrita e ser fã das obras do mestre e, junto, um convite para visitar os seus estúdios.  Foi uma alegria total em meio a um pouco de tristeza, pois eu sabia que, filho de trabalhadores, teria pouca chance de fazer essa viagem e que teria que esperar muito para atravessar o continente para conhecer aquela maravilha. Porém, não deixou de ser algo, um sonho a ser alimentado e
buscado.

UniversalDepois de 50 anos, vi o meu sonho realizado. Pude conhecer de perto todo complexo dos estúdios Disney. Confesso que senti toda a emoção de minha infância agora, sendo realizada em companhia da terceira geração da família (meu Neto).  E, comigo, estava toda Báraka do meu lugar, do meu bairro, da minha memória e da minha cidade, recebendo a benção de outro lugar. Havia a energia, a força buscada, o evoluir, o sentir, a  transformação operando em cada parte do meu interior, e sabíamos e tínhamos consciência de que aquilo não era simplesmente um lugar e sim “o Lugar”. A infância do passado concretizada no futuro, ou melhor, no agora.
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João Carlos Teixeira Gonçalves é professor dos Cursos de Comunicação da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP). 

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