Jovens querem menos sexo nos filmes. Viva o novo puritanismo!

Jovens querem menos sexo nos filmes. Viva o novo puritanismo!

A história do cinema seria a mesma sem O último tango em Paris (1972), de Bernardo Bertolucci, ou sem O Império dos Sentidos (1976), de Nagisa Oshima? E o que dizer da importância dos menos clássicos – mas também campeões de bilheteria – como 9 ½ semanas de amor (1986) ou Ata-me (1989) entre outros do Almodóvar? Verdadeiros ícones do cinema – com suas cenas eróticas e de sexo – foram filmes que marcaram época, garantiram mudanças expondo novos comportamentos, fortaleceram polêmicas e simplesmente foram aplaudidos, festejados. Seria impossível ignorá-los – nem precisa ser cinéfilo, basta ser da geração que os viu serem lançados. E, naturalmente, quis assisti-los.

Eis, no entanto, que de repente os mais jovens querem menos cenas de sexo nos filmes. E as novas produções cedem cada vez mais seus espaços aos super-heróis – avessos ao envolvimento sexual, em sua maioria, assim como também acontece com as cenas de violência e drogas. Como aponta claramente Almodóvar: “os super heróis são assexuados, castrados”.

Não se trata de opinião ou de juntar informações mais atualizadas. A nova tendência foi apontada em pesquisa realizada na Universidade da Califórnia, em 2023, que indicou que “45% dos membros da geração Z entrevistados (nascidos entre 1995 e 2010) consideram que filmes são melhores quando não incluem sexo”. E como bom produto de massa, os filmes norte-americanos atenderam às novas preferências. Outra pesquisa, publicada no The Economist, mostrou que as cenas de sexo nos 500 filmes de maior bilheteria entre 2000 e 2024 caíram cerca de 40%.

Vale lembrar que não se está falando de pornografia, mas de cenas que normalmente seriam projetadas em cinemas, até algum tempo atrás, para o prazer das plateias – com roteiro, com atores conhecidos, dentro de um clima já integrado ao estilo cinematográfico dos romances, dos envolvimentos dos protagonistas, das histórias mais picantes. Cenas que, aliás, nem eram mais censuradas, obedecido certo critério de idade recomendada.

As mudanças das novas gerações parecem estar se consolidando numa alteração de interesses que, há que se perguntar, poderá indicar o retorno a padrões moralistas mais rígidos? Que papel passa a ter o sexo, que pareceu ser uma conquista das mais efetivas nos anos 1960, deixando para trás destinos quase que predeterminados de casamento, filhos, fidelidade? Excesso de pornografia de mais fácil acesso gerou o cansaço por algo que, por muito tempo esteve envolto até mesmo na ignorância do que era possível na intimidade do ato sexual? Ou será simples desinteresse a partir de ter sexo como elemento mais disponível, sem tantas censuras, limitações, controles? Há um surgimento de outras formas de relações afetivas?

Grandes diretores de cinema, entretanto, parecem pouco se importar –  dispostos a enfrentar padrões de uma moral mais conservadora e que, na contramão das últimas décadas, estão a atingir primeiro aos jovens. Falando à revista Variety, um ano atrás, o holandês Paul Verhoeven (diretor de Instinto Selvagem) também considerou que, especialmente nos EUA, existe atualmente um movimento generalizado na direção do puritanismo. “A sexualidade é o mais básico elemento da natureza. Eu sempre fico pasmo ao ver que as pessoas ficam chocadas com sexo em filmes”.

É uma mudança a ser acompanhada. Não deixa de ser indicativo de quanto as novas gerações vão se tornando avessas a qualquer manifestação mais explicita de sexo, quando se surpreendem com cenas que, até tempos atrás, lá estavam em filmes até ingênuos, como Os caça fantasmas, O Exterminador do futuro, Trocando as Bolas. Como bem dito pelo escritora Raquel Benedict: “as cenas destes filmes não nos chocaram quando as vimos pela primeira vez. [Nós pensávamos] É claro que tem sexo num filme. Não tem sempre?”

No Brasil – que já viveu anos de ouro com as pornochanchadas e consagrou atores que não foram estigmatizados por nelas atuarem – cabe agora a questão: quanto esse “ter” ou “evitar” sexo nas telonas afetará as novas produções?

 


Beatriz Vicentini é jornalista.

 

Foto de capa: cena do filme “Ata-me”, de Pedro Almodóvar, de 1989.

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