Lucília Reboredo: os beija-flores, a palavra e a vida
Alê Bragion
Vem da tradição esotérica hebraica a crença de que, pleno de Seu esplendor, Deus resolvera contemplar a Deus – e assim desdobrando-se em ciclos celestiais de sete emanações, criou o Senhor mundos espirituais que orbitam plenos do poder espectral da alegria e do júbilo divinos. No entanto, segundo tal tradição, no quarto e último ciclo, pôs-Se Deus a criar o mundo da matéria – destinado à espécie humana. Então, num supremo instante genesíago, eis que o Senhor, cheio de som e de fúria, fez do verbo o instrumento criador de tal universo. Dessa forma, e para além da criação, unia também o Senhor, para todo o sempre, a força da palavra e o poder gerador da vida. Por isso, quando hoje, nos ciclos iniciáticos, aprende o discípulo a reproduzir – letra a letra – os textos da tradição em hebraico antigo, ensina-lhe o mestre-rabino iniciado: “Cuidado, menino, se inverteres uma letra desse texto estarás alterando também o universo!”
Ainda que distante dos ciclos do esoterismo judaico – aos quais provavelmente jamais pertenceu –, mas comungando da ideia de que por meio da palavra transubstancia-se o esplendor da vida, a psicóloga e professora Lucília Reborado trouxe a público, em 2010, o seu iluminado livro A Dança dos Beija-Flores no Camarão Amarelo: curso e percurso do adoecimento. Acometida, desde 2003, pela esclerose lateral amiotrófica (ELA) – patologia que lhe tolheu completamente os movimentos do corpo, sua respiração e deglutição – Lucília, emanando-se à maneira divina e valendo-se do auxílio de uma tabela postada à sua frente, escreveu com olhos, piscando letra por letra, o texto que compõe as apaixonantes páginas de sua publicação – repleta de relatos emocionados e de (pasmem!) testemunhos bem-humorados que descrevem o curso e o percurso do adoecer da autora.
Enraizada em sua cama, condenada pela sorte ao claustro de seu próprio corpo imóvel, Lucília, em particular instante genesíago, desdobrou-se em palavras, repartiu-se em texto, emanou-se em verbos – num movimento de expansão espiritual que é, ao mesmo tempo, redescoberta, reinvenção e renascimento. Como os beija-flores que dão título à sua obra, as palavras de Lucília – ou Lucília refeita em palavras – sobrevoam os seres, bicam as almas e pousam sobre os ramos nodosos da árvore da vida. Por outro lado, também como um beija-flor às avessas, não é Lucília quem – parada no ar, sem movimento rápido de asas – suga o néctar das flores à sua volta. Pelo contrário: é ela que, com sua palavra-vida, leva no bico a essência açucarada do prazer de viver (essência essa só produzida por aqueles que sentem vibrar o corpo quando, simples e naturalmente, percebem que a vida foi feita para ser vivida sob quaisquer circunstâncias).
“Sei que apenas quebrei as asas e que terei de reaprender a voar” – segreda Lucília aos leitores de seu livro, então conhecedores de sua história. De fato. Que Lucília voe sempre – e seu voo carregue consigo também os nossos sonhos, e o ruflar de suas asas possa nos arrastar a todos – mesmo que à força, mesmo que a medo, por conta de nossa falta de coragem – pelos mesmos ares que animam o seu exercício. Que o néctar que tanto ela leva consigo em sua palavra-vida, e que já nos alimenta hoje por meio de seu livro, nos seja sempre abundante e nos dê sempre a certeza de que a vida sempre é possível, desde que eternamente reinventada.
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A Dança dos Beija-Flores no Camarão Amarelo – Curso e Percurso do Adoecimento.
De Lucília Augusta Reboredo.
Apresentação: Ely Éser Barreto César
ISBN 978-85-60677-10-8
Piracicaba: Jacintha Editores, 2010
Que beleza de resenha, a bom espargir emoções ao leitor, a partir de uma abordagem deste livro de Lucília que, por sua vez, é fonte toda particular de mobilização de reflexões! Parabéns!
Caro Heitor!
A beleza que você viu em nossa resenha só pode ser mais um dos “beija-flores” de Lucíla que voam por nossas cabeças. Fonte – como você bem disse – de mobilizações e reflexões, o livro de Lucília é também, e sem dúvida alguma,
fonte inesgotável de vida e doçura!
Grande abraço!
Alê Bragion
BOM EU AINDA NÃO LI O LIVRO!,MAS UMA COISA EU SEI. EU CONHECI UMA PESSOA E ACABEI ME APAIXONANDO POR ELA,SEM SABER QUE ERA PORTADORA DE (ELA).FAZ 4 ANOS QUE EU APENAS COMUNICO COM ELA,SOMENTE ATRAVÉS DE TECLAS!JÁ QUE ELA É IMPOSSIBILITADA DE FALAR.EU A CONHECI POR ACASO EM UM CHAT DE CELULAR,MUITA LINDA E EU ME ENCANTEI COM TUA BELEZA!ELA ME MANDOU FOTOS.NA ÉPOCA EU AINDA NÃO TINHA COMPUTADOR,HOJE EU FALO COM ELA ATRAVÉS DE MENSAGENS INSTANTANEA.SÓ QUE INFELISMENTE EU AINDA NÃO A O CONHEÇO PESSOALMENTE.NÃO SEI AINDA QUAL O MOTIVO DELA.EU JÁ FIZ DE TUDO PARA CONVECE-LÁ QUE SERIA O MEU MAIOR SONHO CONHECE-LA PESSOALMENTE.AS VEZES EU FICO MUITO ANGUSTIADO.EU TENHO MUITO MEDO DE QUE ALGUMA COISA DE RUIM ACONTEÇA SEM QUE EU AO MENOS TER A CONHECIDO.EU SÓ QUERIA AO MENOS PODER LHE DAR UM ABRAÇO A ELA.EU TENHO CAMARÕES EU MEIO JARDIM,AS VEZES EU SENTO E FICO OBSERVANDO A DANÇA DOS BEIJA-FLORES E IMAGINANDO ELA EM MEU JARDIM.
Abraços a amiga Lucília Reboredo,que me inspirou a DANÇA DOS BEIJA-FLORES
de Amauri Olaia