A crise iniciada no Brasil a partir da reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT), em outubro de 2014, parece ter atingido nestes dias o seu ponto de maior tensão e perigo. A não aceitação, pela oposição, da vitória legítima e democrática de Dilma nas urnas, aliada à sanha aterradora de eleitores antiDilma e o estrondoso apelo midiático dos grandes impérios da comunicação no país (impérios esses que, em nítido conluio partidário e oposicionista, inculcam na população, desde a reeleição da presidente, os vermes mentais do fatalismo e da depressão nacionais) transformaram o país num campo de batalhas no qual todos estão, sem exceção, sendo derrotados.
O crudelíssimo e minucioso trabalho de desgaste da imagem do governo da presidente Dilma e de seu partido, executado assim pelos principais líderes da oposição e pelo oligopólio da imprensa, encontrou, é digno que se reconheça, terreno fértil e já arado pelo próprio PT e pela própria presidente ao longo dos anos no poder. Vítima também de suas próprias bizarrices e desmedidas, muitas vezes carente de um discurso objetivo e racional, Dilma apontou para baixo o nariz de sua aeronave presidencial quando permitiu que em seu governo se mantivessem (e mesmo se ampliassem) as mesmas e tão antigas máquinas aparelhadas para se estabelecer o jogo político sob o julgo da corrupção e de mancomunaçōes diabólicas envolvendo políticos de prestígio e empresários de renome; sempre dispostos a qualquer falcatrua para continuarem a explorar a nação e seus cidadãos.
Partindo de uma eleição polarizada e de uma vitória apertada, o que obviamente já a deixara fragilizada logo de saída, Dilma errou novamente quando, no início de seu segundo mandato, voltou às costas ao próprio PT, às lideranças partidárias que a apoiavam e, em especial, a seus eleitores (haja vista a mudança de direcionamento da política nacional por ela estabelecida a partir de 2015). Pior ainda, a presidente se enganou ainda mais profundamente quando optou por transferir o ônus de sua nova gestão para a conta da sempre dolorida e egoísta classe média brasileira – já escancaradamente incomodada com a atenção dos governos do PT para com os mais necessitados em detrimento dos poucos (quase raros) cuidados dedicados a ela. Fórmula pronta, a crise econômica alimentou a crise política, e vice-versa. Logo, e sempre estimulada pelos jornalões compadres da oposição, a opinião pública foi ganhando as ruas das cidades à medida que os combustíveis e a energia elétrica foram subindo e exigindo de seus bolsos um esforço a mais.
No exercício sempre eterno de apagar da memória do povo as conquistas estabelecidas pelos governos Lula e Dilma durante doze anos de bonanças e de prestígio popular (que permitiram a Lula deixar o Planalto tendo na mala um dos maiores índices de aprovação jamais conquistados por qualquer outro presidente do Brasil), imprensa e oposição não mediram cuidados para jogarem nas costas do PT, e somente dele, décadas de escandalosos atos criminosos deflagrados pela Operação Lava-Jato. Liderada por justiceiros com toga de juízes, inflamada por políticos igualmente corruptos e capazes de qualquer articulação para mudarem o resultado das urnas para chegarem ao Planalto, grande parte dos eleitores brasileiros investiu e ainda investe sua mais pesada artilharia na tarefa de criar um ambiente político totalmente inviável à Presidente.
Em meio a gritos de “fora PT,” batendo panelas e adorando a falsos profetas e àqueles que, sob pele de cordeiro, desfilam pelas passeatas antiDilma como se seu nome e o nome de seu partido não chafurdassem igualmente na mesma lama suja da Lava-Jato, a opinião pública vem, em grande parte, chancelando o processo de impeachment acolhido por um dos mais tinhosos políticos citados nos casos de corrupção que assolam a nação. De bandeja, e para além disso, a sempre iludida população brasileira está entregando nas mãos de Temer e, consequentemente, de Cunha as rédeas do país. E sob qual lógica? A do combate à corrupção e à retomada do crescimento econômico. Maior ignorância política há tanto não se via.
Na latrina da política brasileira, Temer e Cunha já se organizam para não deixarem escapar de suas mãos a possibilidade de assumirem o mais alto cargo da política nacional – o qual, diga-se de passagem, jamais seria conquistado por eles nas urnas. Articulados, conseguiram a saída de seu partido da base do governo para, de camarote, serem aclamados, tão logo se estabeleça o impeachment da presidente, como os homens mais fortes do Planalto. Descaradamente fisiologistas políticos, esses dois atores fazem parte assim do que há de mais asqueroso na velha política dos coronelões brasileiros – com quem o PT, é fato e não se pode negar, há tempos se pôs a namorar. Todavia, e perto da prática de transitar pelo que é ilícito e de sugar o dinheiro público por meio de negociatas grotescas e escabrosas, o PT de Lula e Dilma é ainda filhote se comparado aos que agora devem ser aclamados como “verdadeiros” líderes da nação.
Se Dilma não agrada, vale aqui a recordação de uma das taxativas máximas da chamada Lei de Murphy: “nada é tão ruim que não possa piorar”. A fossa para qual estão encaminhando em definitivo o Brasil certamente não permitirá que a opinião pública reconheça também os seus erros e sua ignorância política, que tanto vêm contribuindo para que morramos mergulhados no pior dos lodos, ao invés de sairmos dele pela legalidade e pela justiça. Com a configuração do impeachment em curso (que agora corre a passos rápidos na Câmara liderada por Cunha), em breve teremos Temer como presidente do país e Cunha como seu substituto direto. Não haverá mais como, então, escaparmos da descarga derradeira que levará por água abaixo qualquer ilusão de sermos limpos pelo mais vagabundo Lava-Jato de beira de estrada.
É esperar para ver.
(foto: www.jb.com.br)
Muito bom o texto. Estou muito temerosa quanto ao futuro de nossa nação. A cegueira tem vencido a razão! Triste!!!
Prezado Editor,
O Diário do Engenho traz um editorial contundente, com análise lúcida, coerente e ponderações fundamentadas.
Oxalá o exercício de reflexão, o espaço para o pensar crítico e ponderado se desvele como uma via de militância, engajamento político e transformação social.
Com cordial amizade, Prof. Adelino F. Oliveira
Excelente!!! Sintetizou com uma clareza invejável o plano arquitetado desde antes da eleição de 2014 e o momento atual que estamos vivendo! Parabéns!!!
Parabéns ! Um despertador para uma nação que dorme.