Solastalgia, termo de origem australiana, define a ansiedade e angústia experimentadas por quem perde seu habitat, seja por catástrofes, guerras ou afins. O termo foi estendido àqueles sensíveis às alterações climáticas que atingem o planeta – essas causadas por atividades humanas. Ativista ambiental desde os vinte e poucos anos, ecologista, tenho perfil certo para esse troço tomar-me, porque meu grande amor, o maior de todos, sempre foi a Deusa Gea.
Na primeira vez em que usei Ayahuasca, durante o ritual vi imagens da criação das espécies. Algo esférico e bem dinâmico – um ramo dava origem a outro, sequencialmente. Imensidão de seres desfilava frente a mim – muitos se extinguiam num beco sem saída, outros mudavam e evoluíam. Estava encantada com as belas cenas de filogenia! Até que me senti mal e, claro, fui ao banheiro vomitar. Lá, acariciaram-me os cabelos, uma voz feminina consolou-me: que ficasse tranquila, que vomitar não era nada, dizia a voz. Uma das mulheres me acompanhara tão amigavelmente até lá? – pensei. Não, eu estava só no toalete. Dizem que a bebida contém uma entidade feminina de proteção e, se assim é, o carinho com o qual a Mestra me acolheu foi comovente e inesquecível – mas isso é outra conversa.
O fato é que sempre amei o planeta e lutei muito para que mudanças climáticas, feitas por nós, nunca acontecessem, para que jamais houvesse um apocalipse nuclear. Chegaram as mudanças, porém, e o medo real da guerra atômica trouxe-me imensa solastalgia – até que… Até que – e devo dizer o quanto essa ideia nova me surpreende – percebo, na verdade, que não amava Gaia. Amo, e não sem razão, a Holoceno, uma das suas fases, de suas fantásticas produções. Tanta harmonia e dinâmica nas espécies, nos ecossistemas criados, nas formações geológicas e na arquitetura geral!
Amor à Terra no Holoceno! Mas Ela, a Terra, não é apenas isso.
No período Cambriano, dentro da era Paleozóica, não existiam ainda sequer vertebrados. E posteriormente houve primitivas florestas tropicais, com líquens de dezenas de metros de altura e insetos com mais de três de envergadura. E noutra era, também no período Paleozóico? plantas esguias, dinossauros, enormes tempestades. E as glaciações de milhares de anos, do período Quaternário? Imaginemos isso, milhares de anos com apenas gelo e mais gelo. E quando a Terra era magma, recém-nascida, fervia a milhares de graus célsius.
Surpresa, percebi que talvez eu não saiba amar o planeta por inteiro; aliás, que nem possa imaginá-lo corretamente. No entanto, tenho a ideia de sua grandeza, de sua total independência do ser humano, de arrojo e implacabilidade em criar e destruir tanta perfeição e beleza.
Desprezo nossa espécie por ter a ousadia de ser agente da destruição dessas maravilhas vigentes. Muito me entristece. Porém tornou-se sólida em mim a certeza de que, para a Mãe Terra, tal é zero problema. Azar, muito azar é só o nosso, e de tantos outros estupendos seres desta última Criação.
Eloah Margoni.