Se eu fosse você, provavelmente eu não seria eu, uma vez que até onde se saiba, a persona, ou a personalidade, é una, indivisível, e além disso não reside em outro lugar senão no ser biológico da qual emana.
Há, é verdade, estudos paranormais, e outros espíritas, que defendem a tese de que a transmigração em vida seria possível (ubiquidade). Ou seja, aquele fenômeno que ocorreria quando você está aqui, lendo este texto, por exemplo, e de repente se transfere espiritualmente para uma praia paradisíaca, e ao retornar desse passeio lúdico vem com os pés sujos de areia, o que supostamente confirmaria que você esteve mesmo fisicamente em Ubatuba, e ao mesmo tempo aqui, lendo este texto por não ter coisa melhor pra fazer.
Aliás, nosso professor de Filosofia do Direito, na UNIMEP – ainda na década de setenta do século passado – foi o primeiro a nos informar sobre essa possibilidade transmigratória, o que teria contribuído para um seu certo descrédito acadêmico, em que pesasse seu título de doutor. Mas o que também não viria muito ao caso, posto que não tinha o tema a menor pertinência com o conteúdo de suas aulas (boas).
Aliás, falando em Direito, essa disciplina terá sido a área do saber que grande contribuição terá dado à moderna psicologia clínica, e, mesmo à psiquiatria. Explico: tempos atrás surgiu no Brasil uma Lei que criou a sociedade unipessoal. Tá certo que a Presidente era meio atrapalhadinha, a Dilma. Mas, sem gozação, o fato é que alguns estudantes do Direito, como eu, ficamos estupefatos porque como o próprio nome diz, uma sociedade só pode se constituir de duas ou mais pessoas. (Ver Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, dicionário básico, 1988, pg. 606). Tá certo também que já devem ter revisto o verbete do dicionário para atualizá-lo ao novo devaneio jurídico-linguístico-nacional.
Na esteira, surgiram as micro e pequenas empresas (MEIs), também com aquela característica em que você podia se tornar sócio de você mesmo. Costumávamos dizer que nos casos de dupla personalidade, tais pessoas jurídicas seriam factíveis, posto que as duas personalidades que eventualmente habitassem você poderiam conjugar esforços no sentido de explorar uma atividade econômica qualquer. Duro de resolver, porém, seria a dissolução da sociedade. Mas enfim, como diria Christian Dunker, é o que temos pra hoje.
De qualquer forma, o que interessa é que a ideia da pessoa jurídica (sociedade) “una” teria surgido como forma de conceder-se incentivos fiscais para aqueles que a adotassem. Mas quer nos parecer, surgiram fundamentalmente para atender interesses neocapitalistas-nacionais, que não querem mais empregados. Agora todo mundo é autônomo, liberal, porque fica mais barato para a exploração capitalista da mão de obra. E pronto! Não se discute mais!
Como se vê, o capitalismo resolve tudo. Desde crises de identidade até, epistemologicamente, as grandes questões filosóficas do conhecimento.
Dra. Alexandre A. Gualazzi é advogado. De Piracicaba (ou Ubatuba, tô pensando nisso!).