A cultura brasileira, em seu processo de formação, guarda um profundo vínculo com as dimensões da diversidade e da pluralidade. Não é possível pensar e compreender o Brasil sem considerar esta realidade complexa. O sincretismo, fruto do encontro entre as culturas, e a miscigenação, resultado do encontro entre distintos povos, são aspectos constitutivos e estão na base da generosidade de nossa identidade.
As concepções neofascistas, assumidas principalmente pelo atual governo, não são capazes de considerar e respeitar a característica diversa, aberta do povo brasileiro. Aliás, o neofascismo busca negar e anular a dimensão da diversidade, impondo uma sociedade marcada pela padronização dos comportamentos e pela homogeneização dos indivíduos. Passa a ser estratégia oficial criminalizar as diferenças, fazendo do outro o inimigo da nação.
Mas quem é o outro em uma cultura tão rica e plural quanto a nossa, tão bela e profundamente heterogênea? Em um contexto de sociedade democrática, todos devem ser reconhecidos como cidadãos, plenos em direitos. Ninguém pode ser considerado como um estranho, que não faz parte da constituição do país. Esse caráter aberto, que aglutina povos e culturas talvez seja o elemento mais generoso da identidade brasileira.
As marcas da diversidade, mesmo invisibilizadas com ações que buscam promover um processo de apagamento, encontram-se espalhadas por todo país. Em Piracicaba nos deparamos, cotidianamente, com esta verdade, no plano étnico e também cultural. A cidade traz, em sua memória histórica, a presença do indígena, do negro, do europeu. Há, sem dúvida, uma diversidade pujante, que está na base de uma expressiva cultura popular.
No dia-a-dia da cidade, a pluralidade avança também para o campo da ética e da religião, com as várias formas de cristianismo; com os atabaques dos terreiros e seus rituais nas encruzilhadas e tantas outras manifestações do fenômeno religioso. Mas há ainda, neste caldo cultural, os ateus e os sem religião. Compondo o amplo quadro étnico-cultural torna-se importante ressaltar o lugar da diversidade de gênero. Todos com suas maneiras específicas e não menos legítimas de conceber a vida e as relações humanas em sociedade.
É preciso garantir o direito à cidade para todos os grupos e segmentos sociais, suplantando os mecanismos de exclusão, que insistem em negar a cidadania política aos diversos sujeitos de direito. A cidade deve aprender abraçar e acolher todos os seus filhos e filhas. A democracia é assim: lugar de todos e para todos. Todos compõem os cenários da cidade, com seu vigor, suas cores, sua pluralidade. Todos constroem histórias, narrativas, enredos, memórias, lembranças. É desta forma que a cidade cresce, ganha beleza, forma e sentido.
Que em nossa cidade não haja espaço para visões neofascistas, tomadas pelo racismo e por toda sorte de preconceitos. É preciso que todos os grupos, com suas características específicas, tenham lugar de representação nas esferas de poder, mas também ocupando os espaços públicos de referência, com seus símbolos, suas tradições e suas memórias, que compõem a verdadeira história de Piracicaba.
Adelino Francisco de Oliveira é filósofo, professor no Instituto Federal campus Piracicaba e pré-candidato à prefeitura de Piracicaba pelo Partido dos Trabalhadores.