A história é mesmo implacável. As chamadas caravanas da morte – a mobilização de alguns setores empresariais, pressionando para a reabertura do comércio – a ausência de uma voz firme de liderança (convocando toda a sociedade para o enfrentamento da letal pandemia), o processo limitado de testagem visando detectar o contágio do coronavírus, as insuficientes ações do poder público local – com medidas ineficazes para o controle das contaminações – acabaram por lançar a cidade e toda sua população em uma situação dramática e delicadíssima. Piracicaba, infelizmente, desponta agora como um dos epicentros da pandemia do coronavírus.
A explosão do ciclo de contágio na cidade coloca em evidência que a saúde da população está em risco. A vida sempre deve vir em primeiro lugar, sendo a principal preocupação do poder público e dos governantes. Este deveria ser o pondo desde o princípio desta guerra contra o vírus. Quanto mais instabilidade, insegurança e incerteza, mais a crise econômica avançará, sem sinal algum de recomposição e retomada. O empobrecimento das pessoas na cidade vai se agravando e o desenvolvimento social e humano desacelera consideravelmente. O mantra de que, acima de tudo, é preciso salvar a economia, repetido perversamente pelo governo e por setores do grande empresariado, apresenta sua outra face oculta: a perda de centenas de milhares de vidas.
A crise sanitária avança violentamente em nossa cidade, gerando medo e desinformação. A postura confusa e irresponsável do Governo Federal aliada à negação da epidemia por parte das autoridades acabou por confundir os cidadãos, que ficaram sem compreender a maneira adequada de agir e de se proteger. Em Piracicaba, presenciamos movimentos contraditórios: ora se mantinha, ora se fechava o comércio. Pressão de setores econômicos provocou indecisão. Nestes meses, tornou-se comum presenciarmos festas, aglomerações e encontros sociais. Difícil culpabilizar pessoas individualmente – muito mais coerente é apontar para as lideranças governamentais como as propulsoras dessas muitas confusões e ações desencontradas. Faltou liderança, faltaram orientações claras e estratégias no campo da saúde pública.
Nesta última semana, os números de novos infectados e o aumento considerável de óbitos assustaram nossa cidade, gerando pânico e alarmando profissionais da saúde que estão na linha de frente no combate ao Coronavirus. A ocupação dos leitos de UTI chegou ao limite. Doentes da região de Piracicaba passaram a ser transferidos para os hospitais da capital, ante a ausência de leitos. Voltamos para a fase vermelha, sem uma data definida para o retorno da flexibilização das atividades econômicas e comerciais. No momento, o rigoroso e consciente isolamento social coloca-se como a medida eficaz para o controle de tal processo de contaminação e infecção. No horizonte já se coloca, inclusive, a necessidade de se decretar na cidade um lockdown.
Para o momento, a gestão desta grave crise passa pela criação de mecanismos e estrutura de debate e diálogo que possam envolver poder público, agentes de saúde e sociedade civil. Há tempos que se propôs a organização de um comitê de crise permanente, cujas ações assertivas dependem de uma discussão técnica e ponderada. Setores da sociedade – organizações de bairro, conselhos municipais, sindicatos, partidos políticos, empresariado, comerciantes, Igrejas, associações, entre outros – devem ser chamados para a ampla participação. Com atitudes e atividades coletivas, compartilhando experiências já bem sucedidas em outras localidades – como é o caso da vizinha cidade de Araraquara –, torna-se possível vencer a crise sanitária e, por conseguinte, a crise econômica e social. As saídas passam agora pela ampliação e fortalecimento da democracia, consolidando um amplo pacto pela vida.
Adelino Francisco de Oliveira é filósofo, professor no Instituto Federal campus Piracicaba e pré-candidato à prefeitura de Piracicaba pelo Partido dos Trabalhadores.
Excelente análise da situação atual.