Às vezes é preciso um choque, um alerta – como se diz – para não se desviar do caminho nem se perder diante dos acordos mais pragmáticos. A greve dos servidores públicos da educação federal, sob a liderança do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), tem primeiro esse grande objetivo: disputar os rumos do governo democrático e popular que foi eleito para suplantar o projeto político do ultraliberalismo neofascista.
As forças econômicas do mercado têm atuado para impor seus interesses. A mobilização grevista é o recurso, a estratégia mais legítima da classe trabalhadora – de forma a tornarem públicas suas pautas, dando-lhes lugar e visibilidade. De fato, a greve não é o único instrumento de luta da classe trabalhadora. A defesa da valorização de suas condições de trabalho é tarefa diária nos locais de trabalho e nas mesas de negociação com os empregadores. Nesse sentido, é importante esclarecer que os servidores federais iniciaram as negociações com o governo federal desde novembro de 2023. A greve, deflagrada neste mês de abril, representa – de certa forma – o esgotamento de um instrumento, para o avanço no sentido do movimento paredista.
Importante ressaltar que essa greve não é contra o governo do presidente Lula. Fato que setores da educação pública militaram com todas as suas possibilidades para o eleger. A greve se levanta em defesa da educação pública federal, gratuita e socialmente referenciada. Sabido que o governo anterior detratou e atacou a educação pública federal, atuando cotidianamente para destrui-la. Todos sabem, é público e notório: esse foi o governo Bolsonaro. No decurso dos dramáticos quatro anos do governo da morte, o projeto do Instituto Federal se manteve vivo – mas foi por um triz. Mesmo naquele contexto autoritário do governo Bolsonaro, os servidores do Instituto Federal não se acovardaram, atuando na defesa da vida, reivindicando a utilização de máscaras, de álcool gel, defendendo o direito ao isolamento social e o acesso à vacina. A luta era contra a pandemia! Agora é imprescindível recuperar o que foi destruído. Se a educação pública federal não avançar nesse contexto de reconstrução democrática, sob o governo do presidente Lula, ela não terá mais um lugar no futuro. Por isso, a urgência da greve.
A educação é a base para a construção de um novo tempo social e político para o Brasil. A ameaça ultraliberal neofascista, derrotada nas urnas, continua à espreita, espalhando – via redes sociais – por meio da produção sistemática de fake news, a cizânia do caos e ódio social. Cabe à educação, particularmente à educação pública, formar para a ética, apontando para o supremo valor da democracia, da cidadania política, dos direitos humanos e da justiça social e ambiental. O obscurantismo da ideologia neofascista só será suplantado por meio de um vasto processo de formação cidadã, envolvendo a sociedade em seu conjunto.
Para isso é fundamental e urgente se recuperar e fortalecer o genuíno projeto do Instituto Federal, que traz a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão desde a formação básica – abrindo para os discentes as possibilidades de construção de um conhecimento técnico, ético e também político, tão necessário para uma inserção qualificada no mundo do trabalho, de maneira a proporcionar condições objetivas para que esse discente tenha um lugar e seja, ao mesmo tempo, um interlocutor e protagonista das mudanças que a sociedade tanto almeja.
A greve dos servidores da educação pública federal traz, então, muitas pautas de luta: reposição de perdas salariais em decorrência de anos acumulados de inflação e arroxo, a reestruturação das carreiras dos servidores, a abertura de concurso público para recomposição de quadro de servidores, a revisão do orçamento do Instituto Federal há muito defasado, o impedindo o pleno desenvolvimento de cada unidade, a revogação de decretos promulgados ao longo do governo Bolsonaro – que se colocam em franca dissonância com o projeto original do Instituto Federal – e as reivindicações advindas do território, identificadas a partir da realidade e contexto de cada campus do Instituto Federal.
Essa é uma greve de movimento, mobilizando a comunidade interna e externa para as pautas urgentes de luta do Instituto Federal por meio do debate público nas redes sociais e também mediante ações presenciais que carregam dimensões formativas e culturais. A greve não se restringe apenas à pauta econômica: diz respeito a um processo formativo, de reflexão e construção de novos projetos. A dialética da greve dos servidores públicos federais da educação tem como síntese a classe trabalhadora organizada e mobilizada, pronta para defender a democracia, reivindicando os direitos fundamentais de cidadania. Toda luta por direitos leva ao fortalecimento da democracia, expandindo o senso de cidadania. É greve, porque é grave!
Adelino Francisco de Oliveira é professor no Instituto Federal de São Paulo, campus Piracicaba. Doutor em Filosofia e Mestre em Ciências da Religião.
(Foto: Fachada da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo. Rovena Rosa/Agência Brasil.)