Viver no interior paulista exige fazer algumas concessões. Uma delas é tentar suportar a pasmaceira cotidiana de uma imprensa comprometida e tendenciosa – sempre atenta e disposta a fazer da cidade uma ilha de fantasias na qual tudo é sempre perfeito e os problemas e necessidades do município simplesmente não existem ou nunca aparecem nas manchetes matutinas, nos jornais locais televisivos ou nas bancadas de muitas rádios.
Salvo raras exceções, a imprensa piracicabana não foge à regra. Muda em relação aos problemas locais, calada quanto à necessidade de fazer seu papel crítico, inerte quando deveria investigar e exercer sua função primordial – que é a de denunciar e expor o que deve ser realmente denunciado e exposto – a “grande imprensa” piracicabana joga no lixo a sua missão jornalística e se transforma num eterno almanaque de docilidades aos poderosos locais.
Mais do que isso, a “grande imprensa piracicabana” – quase sempre falida, devedora, mal pagadora de seus funcionários – paradoxalmente se coloca, via de regra, como o exemplo mais grotesco do reacionarismo interiorano. Tendenciosa, essa “grande imprensa” defende – para agradar a quem? – as pautas mais absurdamente conservadoras que fariam corar de vergonha até os primeiros povoadores das margens do rio Piracicaba. Escola sem Partido? – tem jornal defendendo. Armamento para a população? – tem jornalista defendendo. Fim da aposentadoria com a reforma da previdência? – tem imprensa defendendo. E tudo isso sem nem sequer oferecer o mínimo contraditório ao leitor, sem oferecer ao público qualquer possibilidade de reflexão em sentido contrário. Belo jornalismo, esse! Belo jornalismo!
O que quer a imprensa piracicabana, de modo geral? A quem mais quer agradar nesse rio de lágrimas fascistas que vem se tonando as cidades do interior paulista? Às favas a integridade do jornalismo? Às favas a ética, a missão da mídia?
Ora. Foi o grande Millôr Fernandes quem nos ensinou que o jornalismo é crítica ao poder estabelecido, é coragem para enfrentar os poderosos. É denúncia a quem quer que seja. O mais, dizia Millor, é “armazém de secos e molhados”.
Grande Millôr. Sua fórmula se concretiza por nosso interior, por Piracicaba. A imprensa aqui é e pelo jeito sempre será um “armazém de secos e molhados”.