Para conhecermos os amigos que temos
é necessário passar pelo sucesso
e pelo fracasso.
No sucesso verificamos a quantidade
de nossas amizades.
No fracasso, a qualidade.
Confúcio
“A mão que aplaude
é mesma que vaia!”
Carlinhos Bala
Aprendi com uma professora suíça que o brasileiro não é o povo alegre, amigo e cordial que imagina ser. E aprendi isso a duras penas, uma vez que – tendo questionado a essa minha professora sobre o porquê de muitos europeus serem tão fechados e terem cara de poucos amigos – pude sentir o mais que cortante revés de uma estrangeira que, há décadas, convive com a falsa alegria que por aqui impera. Vocês, brasileiros, se acham muito gentis, muito amigos? – me perguntou, dialeticamente. Pois saibam que, no Brasil, em poucos dias se fazem rapidamente mais que trinta amigos. Mas, com o tempo, percebemos que essas amizades são pura artificialidade – asseverou, encerrando a conversa.
Quando o assunto é cordialidade, especialmente para com os estrangeiros, a artificialidade das relações humanas assume por aqui contornos ainda mais expressivos – e a Copa do Mundo está aí para mostrar o quanto a nossa macunaímica falta de caráter é mais do que perceptível. Fruto talvez de uma reação ao passado escravocrata imposto por nossos colonizadores, em nossas praias o contato com o estrangeiro naufraga num mar feito de solene endeusamento e cruel aversão. E assim é que, enquanto o comércio e o turismo tentam amigavelmente arrancar até o último centavo dos gringos, nos estádios a simpatia brasileira converte-se em velada xenofobia – expressa por sonoras vaias sem cabimento.
A vaia vem se tornando uma de nossas cruéis marcas. Indício de falta reflexão e raciocínio, produto da impulsividade agressiva e covarde, a vaia que impera no país é apenas um uivo sem sentido. O brasileiro vaia tudo: de árbitros de futebol à Presidente da república – não há critérios, sobram ignorância e rudeza. No jogo contra o Chile, o jogador Fred foi vaiado porque jogou mal, o árbitro porque não apitou da forma que convinha aos brasileiros e a torcida chilena porque cantava o hino de seu país. Lamentável. Se para alguns o campo de futebol é o local por excelência da vaia, reafirmo que o brasileiro vaia porque não pensa, porque é pouco cordial, falsamente alegre e grosseiro.
Estupefata, a imprensa espanhola indignou-se ao ver sua seleção sendo vaiada pelos brasileiros, que a plenos pulmões ainda gritavam que a Espanha estava eliminada. A imprensa alemã mostrou-se igualmente surpresa com as vaias brasileiras dadas à sua esquadra no jogo decisivo contra Argélia. Um jornalista catalão também manifestou seu inconformismo com a vaia brasileira, dizendo que esperava que gostássemos de ver um bom futebol e não apenas pensássemos em ganar, ganar y ganar. Nesta semana, até mesmo nossos hermanos argentinos – nada cordiais quando se trata das relações com os brasileiros, reconheço – cantavam pelas ruas que o brasileiro é um povo amargo, e que Maradona é melhor do que Pelé.
Afora a grande bobagem futebolística sobre Maradona, a afirmação argentina que nos classifica como amargos me chamou muito a atenção. Se os argentinos já nos percebem como amargos, talvez já venha caindo por terra, internacionalmente, o mito do homem cordial que criamos para nós (o qual a minha ex-professora suíça já havia detonado há tempos).
Debaixo de nossa própria sonora vaia, talvez a Copa venha mostrando ao mundo uma face menos amiga, menos amável, menos polida – porém, bem mais verdadeira – de nosso país. E isso por que ainda, por sorte, continuamos na linha de frente na disputa pelo caneco.
Fiquemos atentos. Se é fato que vaia de bêbado não vale – como diz o ditado – ao menos parece que ela, no Brasil, vem servindo para revelar o bêbado como tal.
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Alê Bragion é editor do Diário do Engenho.
Dá vergonha ser brasileiro nessas horas.
Vaiar o hino de outro país foi uma falta de respeito enorme!
Uma coisa é vibrar e torcer pela vitória do país, e bem outra é vaiar e xingar o adversário.
Falta de educação e de respeito. Isso só leva negatividade ao nome do Brasil lá fora.
Muito bom artigo, Alê
abrs
Alê.
Seu texto, de maneira dolorida, expôs muitas das minhas angústias ao observar a postura de pessoas na mídia, no público, no privado, nas redes sociais. Tenho me policiado para não me sentir exigente demais. Lendo o quase desabafo – se você me permitir assim entender suas palavras – de um jovem como você, percebo que o sentimento de frustração e espanto não é só meu.
São reflexões sensíveis e sensatas, corajosas, maduras, amargas e realistas. Lúcidas.
Sou grata a você.
Muito bom.
Abraço.
Alê, muito bom o seu texto. Me surpreendo a cada dia também. Bizarrice, sei lá. O que virá pela frente será uma incógnita. Imagino se o time de futebol perder o que veremos nas arquibancadas. Não se pode esperar nada do povo brasileiro, inclusive o de ser “cordial”.
Alexandre, quer saber…..o povo brasileiro as vezes pisa na bola, mas a grande maioria é gente como a gente alegre, feliz, preocupado com o amanhã…..ah o amanhã a Deus pertence.
Adoro ver as cores do meu Pais em todo canto, ver rostos pintados de verde e amarelo, Quem vaiou a Presidente foram os burgueses que infelizmente tem em todo canto, não sabem respeitar, mas sou da outra turma, aquela que chora ouvindo o Hino Nacional e vamos a vitória.
Um abraço e que venham os adversários e ganhe o melhor “o Brasil claro”……bjs
Zygmunt Bauman, questionado sobre amigos em uma palestra comparou o que conseguiu de amigos ao longo de seus quase 90 anos com os amigos que os jovens fazem pelas redes sociais, onde em um dia se consegue algumas centenas de amigos e no decorrer de sua vida(ele) não conseguiu sequer uma dezena.
Esse pensamento só expressa a diferença de percepção do significado de AMIGO, a mesma analogia faço quanto as considerações que tua professora passou, percebo que ela tinha em sua concepção valores divergentes ao significado comum quanto a amizade cordialidade e alegria disposta a estranhos pelo nosso povo, mesmo os mais íntimos amigos tem um limite para essas propriedades, é impossível negar a cordialidade e alegria do povo brasileiro, para essa analogia tem de haver um parâmetro de comparação e para isso basta visitar outros países e verificar a diferença, eles ganham em ordem e repeito mas perdem no carisma, na alegria e cordialidade com os estrangeiros, o que inexoravelmente chegara a conclusão comparativa de que SIM Brasileiros são mais agradáveis no trato entre pessoas desconhecidas do que muitos outros povos.
Acredito que a visão critica desta professora quanto as qualidades de nosso povo esteja mais prejudicada na condição de quem NÃO dá aos outros aquilo que espera para si, assim uma pessoa rabugenta não pode esperar gentilezas o tempo todo de estranhos, então difícil analisar como verdadeiro a afirmação desta sem conhecer suas atitudes em meio a sua convivência, afinal assim como parte das pessoas enxergam meio copo d’agua como um copo meio vazio, outra parte mais otimista enxergam o mesmo copo como meio cheio. esta senhora deveria ser alguém do primeiro tipo.
Quanto as vaias tenho a impressão que é resultado de uma década de desconstrução de valores, onde parte dos atuais dirigentes desta nação vem incentivando a destruição dos valores sociais como família, religião e respeito as instituições, instalando uma quase anomia como didática de persuasão, assim estamos agora colhendo os frutos plantados.
Sim neste país falta educação, atitudes, respeito e honestidade, mas é da classe politica, que não respeita nosso povo, não o educa corretamente e não reflete a ORDEM E PROGRESSO estampada em nossa bandeira.
Taxar toda uma nação como falsa, artificial, sem caráter, xenofóbica, justificar isso como herança escravocrata, etc, me faz pensar que o mal humor estava exacerbado ou talvez o único bêbado da historia seja o autor no momento em que escreveu!
Como dizia minha avó… a maldade esta nos olhos de quem a vê, e o mundo nos devolve aquilo que damos a ele. Talvez essas vaias sejam reflexo do que o povo vem recebendo!
Agradeço a todos pela leitura e comentários! Obrigado! O Diário do Engenho quer ser – de fato – um espaço para o debate e a difusão de boas ideias em relação aos mais variados aspectos do universo cultura. Abraços!
Vivemos um tempo onde o palavreado cansou,em todos os setores da vida social,o magnetismo já não é tão importante ou certeza de apoio.
Tenho a impressão que estamos perdendo muito nosso horizonte,para nós,foi inculcado que o brasileiro é bacana e amável,porém,quem nunca ouviu alguma história de lojas ou parques no exterior que aumentam a atenção e chegam a fechar melhor as vitrines com brasileiros no local¿
De tudo,o melhor é que temos as vaias,hoje podemos vaiar,suponham que a Copa no Brasil fosse na década de 80,provavelmente teríamos muitos presos e nem a notícia dessa manifestação seria divulgada.Aquele cotidiano gostoso do Amanuense Belmiro está terminando,temos que pensar como iremos governar esse novo Brasil,onde os líderes irão ser vaiados ou até tomar sapatadas.mas precisam assimilar o golpe erguer a cabeça e agir para transformá-las em aplausos ou quem sabe votos.