O Ministro do STF Luiz Fux, ao derrubar decisão soberana de seu colega Ricardo Lewandovski, que autorizava a Folha de São Paulo a entrevistar o ex-Presidente Lula, agiu de uma forma duplamente insólita.
Em primeiro lugar, por confrontar oportunisticamente seu colega, agredindo norma interna daquela Corte. E depois porque reintroduziu solertemente, em flagrante desrespeito à Constituição brasileira, a censura à imprensa, na melhor tradição dos regimes ditatoriais. Até a normalmente obtusa Procuradoria Geral da União não se opôs à entrevista, ciosa de que, caso se opusesse, estaria em flagrante conflito com o Estado Democrático de Direito.
O insuspeito colunista Reinaldo Azevedo foi na mosca ao comentar o argumento utilizado por Fux, ou seja, de que a entrevista seria positiva para o PT. “Venha cá, Cabeleira: e se fosse ruim para o PT, o Excelentíssimo permitiria?”, indaga irado e irônico o colunista. E completa: “Ao cassar, monocraticamente, a liminar de um colega, o doutor introduz o baguncismo no Supremo”. O reparo possível ao colunista é dizer que, na verdade, o STF há muito tempo está bagunçando e tumultuando nossa débil democracia.
Fux, na verdade, prega na testa dos leitores da Folha de São Paulo a pecha de idiotas. Afinal de contas, a maioria esmagadora dos leitores desse matutino é constituída de uma elite letrada, que está careca de saber que Lula apoia Haddad. Que argumentos fatais Lula ainda poderia agregar em prol da candidatura de Haddad que essa elite ainda não conhece?
Que outros argumentos igualmente poderosos Lula poderia agregar em sua própria defesa relativamente ao processo que o levou à prisão? Neste aspecto, cabe um aprofundamento. Com efeito, não há, salvo melhor juízo, fato jurídico novo que possa ser agregado. Contudo, a entrevista poderia trazer nas fotos do rosto de Lula o penetrante olhar indignado dos que clamam por Justiça. Nada mais. Poderia trazer também a reafirmação categórica, própria da altivez dos inocentes, de que rejeita a liberdade por vias tortas, advinda de um perdão meramente humanitário. Através dos interlocutores que o visitam semanalmente, Lula tem dito que rejeita o indulto, venha de onde vier, e que quer, pura e simplesmente, que apresentem as provas do seu suposto delito. Na entrevista, é certo que ele reiteraria sua posição, olhando penetrantemente para as lentes da câmera e dialogando com a História.
A decisão de Fux é uma desmoralização terrível para o Supremo Tribunal Federal, já bastante chamuscado pelas decisões que tem tomado, e contribui para colocar mais obscuridade e incerteza na já atribulada crise política nacional.
Para piorar, o Presidente da Corte, Ministro Dias Tóffoli, mantém a decisão do Ministro Fux, desautoriza o Ministro Lewandovski e remete a apreciação sobre o assunto para o Plenário da Corte. Tóffoli assim procede após, dias antes, ter afirmado que o episódio de 1964 não foi um golpe militar, preferindo denominá-lo de “movimento de 1964”. Tais procedimentos sugerem que ou bem ele está acuado e tutelado por pressões insondáveis e não tem estatura para resistir; ou bem, em definitivo, optou pela senda do desmonte da Nação, aderindo aos tempos do neoliberalismo.
O circo de horrores acaba de oferecer outro espetáculo deprimente, com a decisão do senhor Sérgio Moro – sempre ele – de liberar a delação premiada do senhor Antônio Palocci (rejeitada pelo próprio Ministério Público, por inconsistente e vazio de provas), a menos de uma semana do primeiro turno das eleições.
Incrível como meia dúzia de magistrados, de discutível cultura jurídica e de desapreço à Democracia e ao Direito, têm conseguido tumultuar, com suas decisões afrontosas à Constituição, o ambiente político do país.
Inacreditável também é o ruidoso silêncio sepulcral da OAB. Não se faz uma OAB como antigamente.
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José Machado (PT) foi deputado estadual, deputado federal por dois mandatos e prefeito de Piracicaba por duas gestões.