A primeira vez que ouvi a expressão “Moleque Saci” foi numa novela radiofônica da Rádio Nacional, quando, sentado ao colo de meu pai todas as tardes, ouvia em nossa radiovitrola um episódio de “Jerônimo: o herói do Sertão”. Depois soube que o filho de um parente, um bebê, fora raptado por um saci e desapareceu por três dias, tendo sido encontrado em um espinheiral, depois de três dias, por obra e travessura do saci. Havia um amigo de infância, o “Lau” (Laurindo), que certa vez foi pego por um rodamoinho e levantado do chão por três metros de altura. Segundo o boato do bairro, o Saci que vivia dentro do rodamoinho o segurou pela mão e depois o soltou para que ele esborrachasse no chão. Isso aconteceu próximo de sua casa, ali no morro das Carmelitas, onde hoje está o bairro do São Dimas (antiga Vila Boyes).
Por que minha memória trouxe à tona a imagem do Saci? É que comemoramos o Halloween no Brasil, mas esquecemos de comemorar o dia nacional do Saci, em 31 de outubro. O Saci Pererê é representado por um moleque negro, com uma perna só, gorro vermelho e um cachimbo, típico da cultura africana. Dizem que surgiu entre os povos indígenas da região sul do Brasil, no período Colonial (no final do século XVIII). Segundo os folcloristas com que tive o prazer de conviver, como João Chiarini, Hugo Pedro Carradore e o historiador Waldemar Iglésias Fernandes, o Saci nunca teve o objetivo de prejudicar alguém ou fazer maldade.
Quem teve uma infância rica em histórias e conteúdo folclórico jamais esquece o que se ouviu contar sobre o Saci Pererê e suas histórias ricas em ensinamentos e aventuras, que fizeram a alegria da infância de muitas gerações. Nas bancas ou nas portas do cine São José (o “Zelão”), podia-se conseguir gibis (história em quadrinhos) de “Jerônimo: o herói do Sertão,” o mais brasileiro dos quadrinhos, que homenageava o nome do Saci com um personagem chamado Moleque Saci. Sou um fã do Saci, pois sempre me fascinou esse personagem que também foi imortalizado pela televisão através das histórias de Monteiro Lobato, em “O Sitio do Pica-Pau Amarelo”, e que ainda é encontrado em livros e consegue arrebatar a imaginação dos nossos pequeninos.
Jamais me esquecerei desse personagem brasileiro que marcou e marca profundamente a minha memória. E para não esquecer, eu ainda me lembro das molecagens do meu amigo fotógrafo Henrique Spavieri, que morava na pensão Guanabara (da Dona Laura), na Rua Prudente, próxima à antiga Caixa Econômica Estadual, e que tinha como colega de quarto o Ronaldo, dono da Lotérica “Saci da Sorte”, que ficava na Galeria Brasil.
Para encerrar essas memórias, ai vai um trecho do jingle da lotérica do Ronaldo, de autoria de Harley Siqueira: “O Saci da sorte, o Saci Pererê… O Saci da sorte traz a sorte pra você, Sa… Sa.. Saci da sorte traz a sorte prá você…”.
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João Carlos Teixeira Gonçalves é professor nos Cursos de Comunicação da Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP).