Arcado sobre o muro da minha sina, o que vejo do futuro não passa além da esquina. Mas em loas falsas ao mundo à roda do meu quintal, minto-me que tenho um Império, e se minto – sem ironia ou vitupério – faço com que ele me lembre Portugal.
Ai, tristezas tão distantes e tão minhas – referências que invento. Ai, esta vã glória de mandar sobre o nada enquanto me sento no escuro do último degrau da escada. Ai, saudade que nem sinto – saudade que nem sei.
Ai, ânsia de poder cruzar os mares das ruas sem ter medo. Ai, poder deixar os oceanos do que vivemos em segredo, em degredo de sonhos e desejos sem reputação.
Afinal, da vida, a que se destina o curso do destino em curso? Ser Vicente sem vitória, ser aquele que vence sem desbravar a terra e a história. Navegar é preciso. Mas viajar ainda é tão mal. Ai, fumaças do meu cigarro a tingirem de cinza e nuvem a madrugada já tão cinza e tão nuvem que em mim se mimetiza.
Ai, Portugal que crio por ironia à roda do meu quintal e que em sonho me cobre inteiro. Se escrevo – ai Portugal, tão falso dentro de mim – é porque hoje também sou nevoeiro.
Alexandre Bragion é editor do Diário do Engenho.
(Extraído do livro não-publicado “Casa Burguesa Sem-Chave” – finalista do prêmio Claudio Willer de Poesia, da União Brasileira de Escritores, de 2023).
Imagem de capa: Alexandre Bragion