Luta Política Prolongada

Luta Política Prolongada

A luta política não começa, nem mesmo termina, com o processo eleitoral. A eleição é uma etapa importante, mas não é a única dimensão que deve ser levada em consideração na dinâmica de disputa do poder político. Uma derrota eleitoral ou mesmo uma vitória nas urnas indica o início de uma nova fase de uma luta política prolongada.

Em uma disputa eleitoral o que se coloca em questão é muito mais o modelo de sociedade que se quer edificar. A disputa não é apenas pelo poder, mas pelo sentido que o poder pode vir a assumir, estando a serviço de determinado projeto de sociedade. Muitas vezes o eleitor não consegue compreender, mas em uma eleição, para além dos personagens, o debate se dá entre projetos e concepções de sociedade.

Essa compreensão sobre o projeto de sociedade que se coloca em disputa em um processo eleitoral é mesmo fundamental. A partir dela torna-se possível, por exemplo, a identificação dos candidatos que estão em disputa, que podem inclusive representarem o mesmo campo e projeto político. Muitas vezes essa é uma armadilha para o eleitor, que pensa estar renovando, trocando os personagens, mas acaba referendando, sem se dar conta, um projeto que gostaria de rejeitar.

A perspectiva de uma luta política prolongada se coloca no horizonte de uma disputa que se projeta para muito além do período de uma eleição. É a construção de uma base social crítica, fortalecida em sua compreensão acerca da cidadania política. A formação de núcleos populares, organizados no território das comunidades, fomentando o constante debate sobre o cotidiano e as questões que envolvem as realidades locais, descortina-se como o ponto chave na concepção da luta política prolongada. Sem tutela nem instrumentalização, o debate deve ser aberto, crítico, permanente, dando vazão às análises e problematizações.

Sem inventar a roda, e ao mesmo tempo sem propor a mesmice, a luta política prolongada passa, sem dúvida, pela capacidade de articular formação política a partir das bases mais profundas da sociedade. É importante frisar que formação é sempre uma via de mão dupla, em um processo dinâmico e complexo, no qual há rico compartilhamento de saberes e perspectivas. Neste ponto, o protagonismo popular é base para que haja um salto substantivo, elevando a capacidade de leitura sobre a realidade social e política.

É preciso a construção de espaços de trocas e diálogos, compondo verdadeiros encontros provocativos, capazes de aguçar a capacidade de ver a realidade, de maneira a alcançar um nível cada vez mais elevado e complexo de percepção e compreensão sobre o mundo. É fundamental avançar, a partir de critérios éticos de julgamento, na análise sobre a realidade percebida, aprimorando as condições teóricas de assumir posicionamentos alicerçados nos princípios de justiça, direito e solidariedade. É imprescindível consolidar o engajamento política, em uma dinâmica de intervenção e atuaçãocmais diretas sobre a realidade.

A luta política prolongada pressupõe o protagonismo da própria população. Esse é o ponto central de todo o processo de formação para a cidadania política. O horizonte deve ser a formação para um olhar crítico, lúcido, consciente, humanizado, analítico e profundamente comprometido com o programa dos direitos humanos. Talvez seja essa a grande saída para a encruzilhada civilizacional que nos encontramos.

Os sindicatos, as igrejas, os centros comunitários, as associações, os coletivos, os movimentos sociais, as organizações estudantis etc. são elementos estratégicos na dinâmica da luta política prolongada. É preciso um intenso e constante diálogo com esses espaços. Mas é também urgente articular, criativamente, outros espaços de interlocução e formação, espalhando pela cidade núcleos potentes de debates. Essa é a tarefa que se impõe.

 


Adelino Francisco de Oliveira é professor no Instituto Federal, campus Piracicaba. Doutor em Filosofia e mestre em Ciências da Religião.

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