Aura
Em maio a tarde não arde
em maio a tarde não dura
em maio a tarde fulgura.
( Adélia Prado, em “Oráculos de Maio”)
Maio é um mês que me alegra. Sempre foi assim. Talvez pela tradição de ser o mês das noivas, ou das mães, o mês de Maria. Mas sinto que a natureza desempenha papel importante nos meus sentimentos. Os dias são muito azuis, repletos de cor, e as temperaturas amenas que deixam o calor excessivo para trás também me fazem sentir um bem-estar especial. Maio é um mês que me emociona.
Isso tudo favorece meus momentos de introspecção, de silêncio interior. São momentos em que reflito sobre meu repertório de experiências, de conhecimentos acumulados no decorrer da vida, de vivências, de alegrias e tristezas, de rupturas, de aprendizado com os difíceis problemas que a vida me apresentou. Importante é acolher o sofrimento e transformá-lo em aprendizado. Difícil, mas essa postura me dá a leveza e confiança indispensáveis para seguir em frente. Afinal, as coisas da vida são como são, nem muito fáceis, nem muito difíceis. Aproveitar ao máximo o dom da vida, mesmo com suas turbulências, é um presente que procuro me dar a cada dia. É meu jeito de fazer acertos na alma, de prestar minha reverência respeitosa ao sagrado. E andar com fé.
Mas maio, neste ano, me trouxe notícias que, também por serem muito repetitivas, me assustam pela violência que carregam. Não são novidades, dirá o leitor. Mas me incomodam demais tantos casos de estupro, de violência sexual contra crianças, discussões repletas de raiva e preconceito sobre redução da maioridade penal, sem uma reflexão mais profunda sobre o papel do estado na qualidade da educação oferecida para nossas crianças e jovens. E reflito sobre o papel de parte da imprensa que descreve esses casos com detalhes escabrosos, que invadem a intimidade de pessoas e famílias, afetando ainda mais sua dignidade, como se já não bastasse a violência que os atingiu. Sempre me revoltou esse sensacionalismo que, acredito, não presta serviço de utilidade nenhum, nada acrescenta de bom, não apresenta alternativas de respeito para a sociedade. Parece que só serve à vaidade de seus apresentadores .
Ao ler o Jornal da USP da última semana de abril (no. 995), me chamou a atenção a matéria “A violência nossa de cada dia”, sobre pesquisa do Instituto de Psicologia da USP que analisa o jornalismo policial brasileiro: “Jornalismo Policial: Indústria Cultural e Violência”, realizada pelo pesquisador Davi Mamblona Marques Romão. Matéria bastante interessante, assinada por Maria Marta Cursino, que recomendo aos interessados no assunto. “…elevando o volume da voz, induzindo o público a concordar, os apresentadores constroem um cenário de referência moral da humanidade”, diz a matéria. “É como se a verdade sobre o mundo fosse entregue em domicílio através da televisão. Nesse sentido, temos como saldo pessoas com uma subjetividade completamente dependente, incapaz de ver a si mesmas participando ativamente dos processos políticos que as afetam. A reflexão crítica é abandonada e, em seu lugar, aparece o conformismo”, diz o pesquisador.
Muito para se refletir, muito para se preocupar, especialmente quando penso no mundo que vão encontrar meus netos que estão chegando agora. Espero, com confiança, que eles possam ajudar a fazer a diferença de que nossa sociedade está necessitando. Venham fazer sua vida valer a pena para si e para o mundo em que vivem, meus pequenos!
A música é muito importante para todos de nossa família. Muitas das crises de cada um de nós teve a música várias vezes como o bálsamo redentor, aquele que aquietou a alma e nos fez ver o lado iluminado da situação. Impossível, portanto, não comentar sobre a emoção que nos causaram e, estou certa, ao público que lotou o Teatro do Engenho nas duas noites, as apresentações da Sinfônica Jovem do Estado e da Filarmônica Jovem de Piracicaba, acontecidos há pouco mais de uma semana em Piracicaba. Em ambas, jovens estudantes no palco.
A Sinfônica Jovem, com quase cem integrantes (a mais novinha com doze anos), nos deu uma demonstração de como o ensino público – através da EMESP, Escola de Música do Estado de São Paulo – pode proporcionar à criança e ao jovem uma alternativa para sua formação e educação, dando-lhes uma perspectiva cultural da melhor qualidade. Repertório de grande dificuldade, entusiasmo, concentração, musicalidade que emocionou a todos.
Nossa Filarmônica Jovem prestou homenagem ao maestro Mahle, trazendo-o para a regência do concerto. Sensível lembrança, merecida homenagem. O público que superlotou o Teatro aplaudiu emocionado.
Em uma entrevista para o Jornal de Piracicaba, publicada no domingo do concerto, o Maestro Mahle diz: “A música tem um papel importante entre a juventude. Ela inibe a violência. Em vez de uma arma, os jovens podem ter um instrumento nas mãos. Esta é uma das melhores coisas que a música é capaz de proporcionar”.
Escuto atualmente um CD gravado por um amigo querido para me presentear no aniversário. Sabendo de minha paixão por Smile, de Charles Chaplin, ele gravou muitas versões dessa canção. De tanto que gosto dela, falo para as pessoas que foi composta para mim – e não é que tem quem acredite!
Ela me proporcionou , entre tantos, um momento especialmente mágico. Ao entrar com meu filho caçula na Igreja, em seu casamento, fui recebida pela orquestra de cordas formada por amigos queridos tocando Smile cantada por nosso querido Janu. Uma surpresa e homenagem que me prestaram. A emoção foi imensa. Senti que a rede de meus afetos se ampliou de tal modo que tomou conta de toda igreja. Era uma noite de maio.
Em uma versão livre de Djavan, um trecho: “Sorri, vai mentindo a sua dor, e ao notar que tu sorris, todo mundo irá supor que és feliz”
Assim sorrio, emocionada, supondo que sou feliz, envolta pela luz colorida dos dias de maio.
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Zilma Bandel é pós-graduada em Biologia.
– fotos: Alê Bragion
Zilma, vivemos mesmo na cultura da violência: lemos violência, assistimos violência,comemos violência, respiramos violência e protagonizamos violência. É um bolo indigesto que temos de engolir todos os dias.
É preciso fazer algo pelas gerações futuras!
Para diluir, ou mesmo anular essa violência toda, mais música (da boa!), mais esportes, mais amor, mais altruísmo, mais sorrisos!
Parabéns!
Beijos e feliz dia das mães!
Querida Ivana.
Obrigada por sua leitura e pelo comentário que, com certeza, são grandes incentivos para que pense em prosseguir com meus escritos.
Sensível como é, parece que posso sentir você como uma aliada para minhas emoções causadas pela violência e o bálsamo que a música pode ser para nossa alma. E, claro, como você escreveu, além da música, a solidariedade, o amor, e muitos sorrisos…
Parabéns pela homenagem recebida!
Abraço carinhoso pelo dia das mães.
Zlma,
Para mim maio também é um mes especial .Adorei o texto. Tenho certeza que o dia de hoje também foi especial de alguma maneira para todas nós. Beijos.
Obrigada, Ro, pela leitura e incentivo.
Por mais que resista, o dia das mães sempre me faz mais sensível. É um privilégio ser mãe termos a fé em Maria. Que ela sempre nos acompanhe e inspire.
Beijo com afeto.
Olá, Zilma:
Estou contente por você nos brindar com suas reflexões. É um apoio para não deixarmos que nos domine a desesperança no humano que buscamos, em nós e na sociedade. As vezes, em algum trecho do caminho, o cenário nos incita ao desânimo, mas reflexões como a sua nos levam a acreditar que é possível chegar lá. Se as vezes sofremos é porque o “o Homem é, ao mesmo tempo, mármore e escultor”
Ainda é tempo para cumprimentá-la pelo dia das Mães.
Newman
Muito obrigada, Newman, por sua leitura e comentário. É um importante incentivo para mim, iniciante que sou. Sua postura diante da vida e do ser humano, sua elegância de trato, sua sensibilidade e espiritualidade diferenciada sempre foram referências importantes para nossa família. Por causa disso suas reflexões sobre meus escritos têm grande importância para me fajudar a prosseguir falando da vida, como você mesmo já me escreveu.
Obrigada também pelo cumprimento para o dia das mães. Mesmo não querendo dar importância, minha sensibilidade fica mais aflorada nesse dia. Coisas de mãe…
Abraço com afeto.
Sim, maio de Maria, e maio transformado em alaranjado, fulgura em nosso imaginário a partir de Adélia Prado. Pano de fundo para afirmar que somos mais que uma massa conduzida por pessoas ou instituições que dominam o “tom” da palavra de ordem da vez. Corrobora com você, em sua felicidade, o trecho do poema de Robert Frost: “…
De modo que nas vezes quando a multidão é movida
A levar demasiado longe o louvor ou a censura,
Possamos escolher algo como uma estrela
Na qual estear nossas mentes e sermos estáveis.”
Música, palavra, aproximações com o âmago de cada pessoa, que em princípio é boa, para conduzirmos a vida com dignidade.
Obrigada pelas provocações, Zilma.
Renata
Querida Renata.
Você sempre com um olhar que amplia minha compreensão!
Obrigada, por sua leitura e colaboração para minhas reflexões.
A redenção, a dignidade, a esperança, algo como uma estrela para poder sustentar nossa mente e nossa alma, o sorriso, a fé. Bom termos tudo isso, não é, amiga?
Beijo carinhoso.
Zilma
Sempre uma oração ver sua emoção.
Beijos
Fábio de Pádua
Olá, Fábio.
Você é sempre muito generoso comigo.
Obrigada pela leitura.
Bom sentir a mesma sintonia dos amigos em nossa emoção.
Beijo com afeto.
Oá Zilma amiga querida!
Texto gostoso, embora amargo em sua essencia, pois a violencia que grassa em nosso país é extremamente preocupante em vista da chegada de tantos pimpolhos e o que esperar desse mundo para eles. não é?
Mas, voltando ao texto, por força da amenidade de maio, está suave e ondulante em suas emoções. Muito obrigada mais uma vez por nos brindar com mais essa produção.
Que bom, Ariadne, que você gostou deste também.
É a amizade provocando a sintonia nas emoções, não é?
Espero, com confiança, que meus netos possam encontrar um mundo melhor, mais seguro, mais feliz. E que eles também possam fazer a diferença e acresentar bons valores por onde circularem.
Beijo carinhoso.
Querida Zilma
Adorei o seu texto, ao mesmo tempo poético e denunciador. Realmente, creio que é preciso atacar a violência em suas raízes e proporcionar aos jovens alternativas para a banalidade imperante. A música é, sim, um instrumento muito poderoso, que eleva e enobrece a alma. Parabéns a todos os que se empenham em divulgá-la. E, quanto a você, continue sempre nos brindando com as suas reflexões. Abraços,
Marilda.
Querida Marilda.
Muito feliz por tê-la como leitora, com sua visão repleta de sabedoria, lucidez e sensibilidade, de força e elegância.
Precisamos ter alguma certeza que deixaremos para nossas crianças um mundo em que o ser humano possa viver com dignidade e ainda apreciar a beleza de uma natureza tão mal cuidada. E que elas venham para fazer a diferença!
Obrigada, Marilda.
Beijo com afeto.
Zilma querida,
mais um texto seu a despertar emoções, lembranças, preocupações e …esperança! Já no seu início ele me encantou: tenho sentimentos semelhantes aos seus em relação ao mês de maio e também me angustio com a forma com que a violência é explorada pela mídia e com o mundo no qual meus netinhos já estão vivendo! Mas mesmo comentando sobre assunto tão árduo, sua linguagem é doce e suas palavras não agridem o leitor, apenas convidam à reflexão. E você sabe como ninguém apontar caminhos, trazendo as emoções que a música tem proporcionado a sua família e vivenciadas recentemente, expressando mais do que esperança, a certeza do papel formativo que a música exerce nas novas gerações. Gostei muito, Zilma, me emocionei!
Com carinho.
Querida Miriam.
É muito bom sentir essa sintonia nos nossos sentimentos, angústias e emoções. Amiga de tanto tempo, sempre presente nos bons e maus momentos, mesmo que com uma boa distância nos separando, suas palavras me dão alento e me emocionam também.
É um grande incentivo. Obrigada, amiga.
Vamos ver até onde vou com meus escritos…
Beijo com muito afeto.
Querida amiga,parabéns!
Mais uma vez um texto lindo, sensível e inspirador, um grande presente para todos os leitores e especialmente nós mães ,que temos a obrigação de prepararmos nossos filhos para fazer desse mundo um lugar melhor e com menos violência. Realmente ,acho que você e o Maestro Mahle tem toda razão , a música é um ótimo caminho . Um beijo e parabéns também pelo dia das mães, você merece muito.
Obrigada, Rose amiga.
Suas palavras são sempre repletas de generosidade.
Pela minha história, falo da música pelo papel que tem na nossa vida familiar. Mas, tantos projetos espalhados pelo Brasil e pelo mundo mostram como a música pode ser realmente um instrumento de redenção.
Minha homenagem a você também como mãe dedicada e batalhadora que é.
Beijo carinhoso.
Comadre, vale chorar?
Viajei com a leitura de seu texto. Foi tudo muito real, cheio de emoções.
Inspirado em sua vida, trouxe-me saudade de um tempo em que viviamos com mais segurança e havia muito menos preocupações com o futuro. Eramos felizes e não sabíamos. Enquanto isso, comadre, sorri , esse tempo também vai passar,
beijosssss
Berna
Muito obrigada, Berna, pela leitura e comentário.
Tínhamos mais liberdade para ir e vir, aproveitávamos mais a cidade, sem medo.
Mas, sei que é mundial o problema. As notícias que chegam de fora não são muito melhores que as nossas. Sinto que é uma decadência do ser humano, seja moral ou espiritualmente.
Há que se trabalhar para formar um mundo mais justo, mais seguro, mais feliz. Nossas crianças agradecem.
Beijo carinhoso.
Linda reflexão, a vida é assim mesmo, nem sempre inverno nem sempre verão, um maio constante, parabéns pelo exemplo de vida também.
grande abraço.
Marcos Villa Nova.
Olá, Marcos.
Obrigada pela leitura e comentário.
Gostei da sua reflexão. A vida é assim mesmo. Procuremos aproveitar ao máximo os momentos de luz, das cores de maio, e enfrentando, crescendo e aprendendo com os momentos nebulosos, sempre com o sorriso de gratidão pelo dom da vida.
Penso que essa é uma das maneiras de fazermos a diferença, plantando momentos de harmonia, sabedoria, alegria e paz por onde passamos, mesmo quando são grandes as turbulências. Difícil, mas vale tentar.
Abraço com afeto.
Também amo o mês de maio, as tardes, o brilho do sol nas cores outonais, curto ver as folhas caindo e mesmo as já espalhadas pelo chão. Época que caem as folhas para transformar as árvores caducas com seus belos ramos que parecem secos e mortos em seres dormentes, para passarem o outono e o inverno fortalecendo-se e retornando como milagre verdejantes para florir e colorir na próxima primavera.
Beijos Zilma, não se esqueça de dar aquele BEIJÃO na Claudinha.
Obrigada meu querido Luís.
A afinidade nos gostos, emoções, sentimentos está sempre fortalecendo os vínculos da nossa amizade.
Obrigada por sua leitura e comentário. É importante para mim.
Fique bem, em paz, sempre com Deus.
Beijo carinhoso.
Zilma
É impressionante o que você consegue com seus textos.Emociona a quem quer emocionar,faz refletir quem você quer que reflita,dá esperança a quem quer ser esperançoso,dá asas à imaginação para aqueles que querem imaginar…Realmente,maio com suas manhãs frias,tardes que se aquecem e noites frias é um mês lindo.Minhas flores de maio estão lindas,as rolinhas vêm comer o milho jogado no terraço…é tudo muito poético.Tudo isso associado à música,então!!!É um renascer da alma.Seria bom mesmo se as escolas voltassem a ter aulas de música, a ensinar conceitos musicais e colocassem um instrumento na mão das crianças e jovens.Toda quarta feira,a escolinha em frente de casa toca o HINO NACIONAL,ergue nossa bandeira e as criancinhas(MESMO,até 6 anos)cantam o nosso Hino.É lindo , sempre vou ver e me emociono.Como você, também me preocupa o futuro de minhas netas(por enquanto só ELAS),com essa violência cada vez maior e espalhada aos quatro cantos pela imprensa.Mas,devemos ter esperança ,como você mesmo diz;ter esperança que elas façam a diferença nessa sociedade,ter esperança de ouvir mais música e menos tiros,enfim esperança de um futuro melhor.Obrigada pelos seus textos,que nos trazem bastante alento à alma.Um grande beijo
Querida Dida.
A leitura de seus comentários é uma grande motivação para que continue a escrever.
Obrigada, amiga. Obrigada por ler, obrigada por comentar, obrigada pelas palavras de afeto.
Temos a mesma formação familiar, convivemos muito para nos reconhecermos nos mesmos valores. Que bom isso tudo.
Há muito não nos vemos, mas é como nunca tivéssemos nos separado fisicamente.
Temos que acreditar, temos que fazer algo que promova mudanças para melhor, temos que ter boa música na vida.
Não podemos perder a fé. Nossos netos terão um mundo mais tranquilo, com certeza.
Beijo com carinho.
Querida Zilma.
A distância entre não conhecê-la e, conhecê-la, não chega há um ano. Felizmente o nosso primeiro encontro foi motivado pela música, sim, a boa música interpretada pelos seus dois filhos no Teatro Losso Neto. Quanto orgulho e emoção via no seu olhar naquela noite!
Quero dizer-lhe que a mim também me encanta o mês de maio, sobretudo o outono. Tardes de outuno para mim são mágicas…e mágicas foram suas palavras no texto acima, para definir Emoções…
Espero que da estrela escolhida pela sua querida amiga Renata, ela esteja vendo que agora vislumbra um horizonte para a multidão de brasileiros, talvez não sejamos mais uma massa conduzida por pessoas que transgridem e dominam o “tom”.
Zilma, o seu sorriso da foto condiz muito com sua predileção por Smile, em todas suas versões…
Continue nos brindando com suas emoções. Parabéns!
Cleide Pires
Querida Cleide.
Só tenho que agradecer por seu carinho e generosidade nas palavras.
Sua amizade só me acrescenta com bons valores, com seu bom combate.
Ter pessoas como você por perto é a certeza de boas vibrações, de boa energia para continuar nossa luta e fazer a vida valer a pena.
Deixo meu afeto com você.