A democracia tem entre suas balizas a possibilidade de disputas, de tensões no campo das propostas. O confronto democrático deve acontecer no âmbito das perspectivas políticas, dos projetos para a sociedade. O ponto de convergência da tensão democrática se situa na busca por uma organização social que melhor reflita a noção de justiça. Assim, a divergência democrática não está no conteúdo – que consiste na busca pelo bem comum –, mas apenas na forma – os meios estratégicos para se alcançar o melhor para a coletividade. O que se coloca em disputa é tão somente a maneira como se alcançar e promover mais justiça. Desvela-se totalmente incongruente com o modelo democrático a existência de estruturas sociais promotoras de desigualdades.
Por isso que o modelo democrático se contrapõe a toda forma de autoritarismo, de totalitarismo, de censura, de intolerância, de violência aberta etc. No ambiente democrático deve vicejar o debate franco, a abertura para o diverso, a tolerância com o novo, com o que se manifesta como plural e divergente. A tolerância democrática deve ter como critério a dimensão libertária. Tudo que amplia direitos, gerando mais liberdade e possibilidades de vida deve ser tolerado. No contraponto, tudo que promove opressão não pode ser tolerado.
A democracia sempre se alimenta de mais democracia. Quanto maior a participação ativa da população na política, mais qualificado se torna o processo democrático. Só se constrói uma democracia de alta intensidade com pleno, aberto e irrestrito engajamento dos cidadãos na esfera política. A construção de uma democracia de alta intensidade, sedimentada em uma ativa participação política por parte dos cidadãos, ao mesmo tempo que reforça, em cada cidadão, o sentimento de pertença a um projeto comum de sociedade, também garante o pleno acesso e realização no campo dos direitos fundamentais. A sociedade passa a ser compreendida como responsabilidade e construção de todos.
Em uma democracia de alta intensidade, a soberania pertence única e exclusivamente aos cidadãos, que definem os rumos da sociedade. A vontade política dos cidadãos, expressa de maneira direta, em processos plebiscitários de consulta pública, é sempre soberana. Quanto mais participação direta do cidadão, maior o nível de democracia. Torna-se inconcebível, em uma democracia com alto grau de intensidade, que alguma instância representativa de poder, possa obstruir a efetiva realização da vontade popular.
A eleição é sempre um momento singular de todo o processo democrático, pois é o espaço no qual os cidadãos expressam, de maneira direta, sua soberana vontade. O impedimento da candidatura de Lula – que desponta como o candidato com maior projeção e intenção de votos – rebaixa a democracia brasileira, por não acatar a vontade cidadã. Quando surdos aos anseios populares, os poderes, mesmo institucionalmente constituídos, tornam-se ilegítimos, corrompendo a noção mais básica de democracia.
Adelino de Oliveira é doutor em filosofia pela Universidade Católica de Braga – Portugal – e professor no Instituto Federal Campus Piracicaba.
Excelente, Adelino!!!
Excelente texto!