Lecionei no Curso de Direito da Unimep por mais de 45 anos, e cheguei a ser membro ativo, inclusive, da diretoria da Associação dos Docentes da Universidade Metodista de Piracicaba, a “Adunimep”, por aproximadamente 20 anos ou mais. Como vinha do curso de Direito, e ali na associação a maioria de seus membros eram professores de outras áreas/cursos, como Filosofia, Pedagogia, Administração, Economia, Engenharias, Ciências Biológicas e da Saúde etc., logo aprendi a diferença entre mim, um amador, e eles (as), profissionais da educação.
A despeito de a entidade ser uma associação de profissionais, no caso de professores, discutiam-se ali os mais variados temas de interesse acadêmico, inclusive os relacionados à qualidade do ensino, e logo vi, e aprendi, o verdadeiro amor e dedicação à causa da educação, inclusive a partir de estudos feitos nos fóruns próprios da Universidade (como o Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão) e que, todavia, extravasavam para o âmbito da Adunimep – eis que eram reiteradamente lembrados pelos associados como parâmetros à nossa atuação como representantes profissionais, inclusive como exigência ética com a comunidade em geral, o que fazia da Adunimep muito mais que um mero órgão sindical. Enfim, planos de ação históricos aqueles, como a “Política Acadêmica” da Unimep, pioneira no Brasil, aprovada após árduos e profundos trabalhos desenvolvidos pelos(as) professores(as), que acabaram por granjear o respeito e admiração da instituição perante o concerto das universidades brasileiras em geral, públicas e privadas, aquelas que, mesmo sendo públicas, à época sequer tinham nosso invejável plano de ação acadêmico-comunitário aprovado e em vigor.
Lembro-me, neste passo, de Elias Boaventura, Ely Eser Barreto César, Almir de Souza Maia, Gustavo Jaques Dias Alvim (e outros), reitores e vice-reitores que se empenharam, incansável e até estoicamente, na luta por uma causa que transcendia a atividade escolar, para atingir níveis de puro idealismo ético-moral (ou espiritual). Enfim, educadores!
Tive também que apreender a ouvir e entender as críticas dirigidas aos meus colegas de curso (e a mim também) que, convidados, em sua maioria eram ausentes daqueles estudos e discussões. (Cito, exemplificativamente, algumas honrosas exceções como a dos saudosos Ercílio A. Denny, José Ribeiro Borges e Benjamin Garcia de Mattos). Isto se dava principalmente por que, advindos da atividade pública, inclusive do Poder Judiciário – como juízes, procuradores públicos, promotores de justiça, cartorários e outros, inclusive advogados com escritórios em pleno funcionamento (meu caso) – também acabavam por não se dedicar à causa da educação (por quais razões que fossem, talvez até compreensíveis, como falta de tempo) o quanto de sacrifício e zelo que esta exigia e exige.
Vejo agora um texto escrito por um ex-colega do curso de direito (já não sou mais professor da Unimep) em que este declara seu amor à instituição (sentimento do qual igualmente compartilhamos), e no que se diz propenso a trabalhar mesmo sem salários para salvar a escola da crise em que se encontra (como diz, e consabido, os salários estão cronicamente atrasados, dentre vários outros direitos laborais inadimplidos).
O texto, todavia, me leva às presentes reflexões, pois que poderia inadvertidamente remeter à ideia (o que penso não ter sido a intenção do autor do referido texto), de que aqueles professores – profissionais do ensino, cuja maioria terá participado daqueles trabalhos e embates político-educacionais mencionados – estariam agora esmorecendo e, mesquinhamente, fazendo greves, acionando a Justiça do Trabalho e, enfim, buscando solver seus problemas financeiros – como pagar o açougue, a farmácia, o supermercado, a mensalidade da escola de seus filhos, ou seja, lutando por sustentar sua família e a si próprio – por mero desamor, ingratidão ou por quaisquer outros motivos materialistas de somenos importância, olvidando-se assim de um passado glorioso de culto à ciência e à educação.
E é justamente aqui que se apreende a diferença entre estes professores, os profissionais, e os diletantes – posto que o amador ganha a partir de R$10.000,00, podendo chegar a R$30.000,00 por mês, ou mais, a partir do aparato estatal que o sustenta ou de sua banca de advocacia, e vêm à universidade para dar três ou quatro aulas e sair correndo para o conforto de seu lar, sem precisar ficar amuado em reuniões acadêmicas, e depois desesperado com atrasos salariais, porque amanhã um polpudo depósito será efetuado em sua conta corrente.
De mais à mais, é amargo ter dedicado sua vida à construção de um projeto de ensino vitorioso, de elevado timbre ético-moral, e ser ignorado de forma olímpica e desdenhosa. Crises? Sempre houve. Saídas? Sempre houve. Este é o problema. As últimas administrações da Unimep reiteradamente evitaram a colaboração como forma de contornar as crises. É como se a Igreja Metodista tivesse perdido a fé, inclusive em seus pródigos. O que compreensível no mundo materialista em que vivemos. Quiseram simplesmente destruir um muito bem sucedido projeto de ensino. Parece que conseguiram! Mas a obra dos verdadeiros educadores, metodistas ou não, esta ficará indelével para a história. Não haverão de ser esquecidos.
Isto posto, não critiquemos aquele que, por passar necessidades básicas, busca o arrimo do Judiciário Trabalhista ou o de suas organizações profissionais como os sindicatos. Só quem vive as agruras de ser um educador no Brasil e de ter de viver desta forma de vida e trabalho é que pode aquilatar o real sacrifício que isto importa.
Dr. Alexandre A. Gualazzi é advogado, ex-professor e doutor em Direito.
(Foto de capa: Alexandre Bragion – aclamação da greve de agosto de 2017, Teatro Unimep).
Coisas valiosas tendem a manter o valor ao longo do tempo. Os milhares de alunos tocados por esse processo excepcional. As centenas de teses produzidas em seus muitos programas de pós graduação. Projetos de vida fundados naqueles tempos memoráveis. Isso tudo permanece.