Sombra e Luz: elementos básicos da arte da fotografia e da pintura. Luz e sombra: jogo do claro-escuro – aspecto que se reflete também nas construções arquitetônicas ao longo da passagem das horas, dos dias, do sol e do brilho da lua. Sombra: a nos impor o seu mistério, o desconhecido, o que há de vir – em surpresa, em suspensão. Luz: projeção, brilho que ilumina figuras e nos enche os olhos de uma radiação imagética, cheia de formas, detalhes, riscos, traços e cores.
De mais difícil percepção na composição musical, sombra e luz metaforicamente talvez possam também ser sentidas na música por meio da combinação de elementos aparentemente contrastantes, como no jogo da dinâmica sonora do forte e piano, no colorido da execução alternada de arcos e pizzicatos – tão presentes, por exemplo, nas composições do barroco tardio das obras de Vivaldi e Telemann.
Sempre igualmente revelando um gesto que mostra e esconde, que põe e tira, que adiciona e subtrai, subtrai e adiciona, a sombra e a luz assemelham-se assim a uma série de vibrações de ondas sonoras que, em sequência, fluem num vai e vem polifônico que ora surge ora desaparece, ora se projeta ora se quer apenas contorno. E é nesse sentido fluente e de uma maresia sonora que envolve e cativa é que vem à luz e a público o disco Sombra e Luz, de Júlia Simões e Marcos Cavalcanti – numa produção independente realizada pelos próprios artistas.
Rico em luz – na voz clara e límpida de Júlia – o disco apresenta 15 faixas sonoramente coloridas e que podem levar o ouvinte a perder-se nas sombras sublimes do prazer advindo das sensações ainda sem explicação provocadas pela apreciação atenta da boa música. Seja cantando apenas acompanhada pelo violão de Marcos Cavalcanti ou ainda ao lado de um conjunto sutil (que surge das sombras sonoras de uma discreta bateria e de uma percussão de extremo bom gosto), Sombra e Luz carrega em suas faixas a projeção do brilho musical de Júlia e Marcos e uma dinâmica contrastante: a singeleza e uma (paradoxal) força sensual marcante.
Passando por composições cheias do um vai e vem marítimo – que vão de um samba leve, chegando ao charme misterioso e obscuro da sensualidade da canção em forma de balada (passando ainda pela batida sincopada de um “xote” gostoso) – Sombra e Luz, Júlia e Marcos, projetam-se, completam-se, compõem-se nesse disco. Sombra e Luz, Luz e Sombra, tornam-se assim elementos complementares – cheios de energia e intensidade – a formarem um par indissolúvel e delicioso (cabendo destacar, em especial, nesse sentido, as faixas de número 10 – “Cantar” – e 2 – “Dia Estranho”).
Linda luz que se projeta nas sombras do ano de 2014 que se inicia, Sombra e Luz abre o novo ano impondo-nos grandes esperanças de que a música (dita popular) de nossa terra possa sair definitivamente das sombras terríveis que por vezes a acompanham. Júlia Simões e Marcos Cavalcanti, Sombra e Luz, nos enchem com seu disco de uma sensação deliciosa e de uma sonoridade límpida que deve ser compartilhada por todos. Belo disco. Luz para nossas trevas sonoras.
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Alê Bragion.
Uma voz feminina é um balsâmo para nossos ouvidos e Julia Simões é exemplo disso.
Sigo admirando seu belo trabalho, Julia. Muito sucesso, sempre! ;o)