Não estava nos meus planos durar tanto, mas, como a moda agora é viver até dizer “chega!”, decidi agendar os eventos sociais importantes das próximas décadas e dormir no formol para comparecer a todos.
Faço questão, por exemplo, de testemunhar as primeiras bodas de ouro de um casal homossexual. Pelos meus cálculos, isso deve acontecer lá por volta de 2065. Nesse futuro de arrepiar Felicianos, o conceito de casal terá mudado bastante. Casais de três ou mais pessoas lutarão pelo direito à união civil. Os bissexuais formarão trios com um parceiro de cada sexo. Sei que esse tipo de relacionamento já existe. Não vim ao mundo pra me fazer de cega. Conheço muitos cavalheiros que deixam as esposas em casa e saem para namorar os amigos. Alguns têm amigo fixo há décadas, mas se dizem “homofóbicos com muito orgulho” – faltando acrescentar: “com muito amor”. A diferença é que esses “casais de três ou mais” sairão do armário, obrigando a indústria moveleira a produzir camas maiores e os construtores de apartamentos a anunciar “Quartos do tamanho de suas paixões”.
Em 2046, estarei no Vaticano, torcendo pelo resultado do terceiro conclave misto, composto de cardeais e cardinalas, que, finalmente, elegerá a primeira Papisa. Como não custa sonhar, espero que seja uma brasileira com boa formação científica e que passe para a história como Dulce I. Nesse momento, haverá madres rezando missa e episcopisas reivindicando o direito a creche em período integral para os filhos de religiosos casados ou não.
Certo, é pouco provável que a primeira Papisa seja uma brasileira. Talvez ganhe uma italiana, ou uma ítalo-portenha, que escolha o nome Clara, em homenagem a Sta. Clara de Assis. Tudo bem, vou aplaudir do mesmo jeito, com o mesmo entusiasmo com que terei aplaudido, em 2023, o primeiro travesti evangélico a se tornar pastor e senador sem ter que abrir mão dos vestidos e do salto agulha.
Agora, vocês me deem licença. Vou terminar este texto mais cedo e voltar pro meu soninho de beleza no formol. Tenho compromissos com o futuro e os preconceitos da humanidade atual me cansam.
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Carla Ceres
Se meus Pais fossem homossexuais eu existiria….
e aí só responde quem elogia
Desculpe a demora em responder, Fábio. Só vi o comentário agora. Sim, mesmo que seus pais fossem homossexuais, você poderia existir. Ter filhos não é garantia de que alguém seja heterossexual. Muitos homossexuais se casam e têm filhos. Obrigada pelo comentário!
Estimada Carla,
Parabéns pelo texto maravilhoso, irônico, inteligente, com temas fortes, densos, urgentes.
Esteja bem!
Muito obrigada mesmo, Adelino! Muitas pessoas leram e gostaram, mas sem deixar comentário. Posicionar-se requer coragem. Abraço!
Uma postagem dessas, tratando dessa forma a questão homofóbica, é só para quem não tem preconceito e está pronta para o debate, com os preconceituosos. Seu texto, além de oportuno, tem uma visão futurista que pode, perfeitamente, se realizar. Temos que estar preparados à toda mudança plausível…há espaço para todos. Quem incomoda, são os preconceituosos, corruptos, canalhas, etc, etc…
Bravo, Ceres!
Obrigada pela força, Lúcia! Tenho esperança de que as pessoas acabem aprendendo a valorizar os outros com base na bondade que demonstram e não em irrelevâncias como orientação sexual, aparência física, religião, nacionalidade, idade, sexo etc.. Quem sabe, um dia? 🙂 Beijos!
Carla! A cada texto seu, fica nítido para mim, sua superação! Ainda estou para ler, uma crônica da atualidade para a posteridade, com tamanha desenvoltura, dissecando ainda que em um humor ácido, as verdades camufladas na potencialidade das batinas sacramentais e das vozes efeminadas, que nos desdenham, mas que nos imitam, com baixa qualidade. Falta ‘útero’… e isso veio acoplado às fêmeas! Fora ‘fundamentalismos & Cia’. Se cada um assumisse gostos e preferências, com naturalidade… sequer precisaríamos de ‘armários fechados’ e muito menos conservarmo-nos no formol para assistirmos a sequência dos fatos! Eu… vou direto pro freezer pra ver se chego lá! Aplausos, amiga!
Bjs. Célia.
Agora estou de alma lavada, Célia. Claro que elogios são sempre agradáveis, mas seu comentário acertou o alvo quando falou das “vozes efeminadas, que nos desdenham, mas que nos imitam, com baixa qualidade”. Perfeito! Beijos e obrigada!
Carlinha será que demora tanto assim essas coisas?! Podia ser ano que vem porque queria ver Feliciano enfartar com as noticias! Kkkk
Morri de rir com o conclave misto! Kkkk
Legal que você se divertiu, Camila! O futuro distante tem mania de demorar, mas você ainda vai ver muitos Felicianos enfartando no futuro próximo, ainda que seja por outros motivos. Beijos!
oi Carlinha,
o mundo caminha para a evolução,
apesar de alguns Felicianos teimarem em ancorar os acontecimentos à séculos e séculos,
amém…
muito bom,
adorei…
beijinhos
Obrigada pelo comentário carinhoso e consciente, Rô! Beijos!
Esse Feliciano é mesmo uma coisa esquisita. Quando ouvi as primeiras manifestações dele, fiquei assustada com tamanha cara de pau. Mas teve uma situação que me fez rir. Foi quando um outro pastor deputado(é bom ou ruim eu não me lembrar o nome?), defendendo o Feliciano, disse que é ex-gay e que evita ficar perto de outro homem pra não ter recaída. Tem base? Não tem…
E eu me diverti com a história de que o Lennon morreu com três tiros, um em nome do Pai, um em nome do Filho e outro em nome do Espírito Santo. rsrsrs
Há quem goste de sempre julgar, geralmente os preconceituoso são propensos a isto.
Eu prefiro caminhar observando. Realmente o preconceito me cansa, também…
Entro neste teu sono de beleza no formol, porque meu compromisso é com o hoje e com o futuro se assim me for permitido.
Quero ser FELIZ e quero que cada qual também o seja independente de qualquer escolha feita…
Um beijinho, Carla. Seus textos são sempre bem vindos!
Muito obrigada pela presença e o comentário, Malu! Concordo com você. Beijos!
Olá Carla, e que tudo esteja bem!
Todos nós queremos conhecer o que será neste nebuloso futuro. Digo nebuloso pelo fato de que os políticos fazem de tudo para que a galinha dos ovos de ouro não sobreviva tanto empo assim, com estas leis e condutas tão degradantes!
Mas por enquanto vou ficando com o presente por cá lendo e sempre me encantando com os teus escritos, que sempre fala sério desta maneira tão bem humorada.
Agradeço por compartilhar sempre teus pensamentos e bom humor, e diferente da Camila, eu torço para não ver mais qualquer Feliciano com tanto espaço na mídia, dizendo tanta asneira e se promovendo, ele e esta instituição que pensa que cuida dos direitos humanos, somente não sei de qual espécie humana!
Parabéns por mais esta postagem, deveras interessante como sempre!
Assim desejo que teu viver seja sempre de felicidade intensa, grande abraço e, até mais!
Concordo com você, Sotnas, qualquer futuro fica melhor sem esse tipo de Feliciano. Muito obrigada pelo comentário amigo e generoso! Abraço!
Olá, Carla
Se, em vez de escrita, esta crónica fosse falada, ao vivo, eu aplaudiria de pé.
Mesmo sentada, tenho que aplaudir o desassombro com que aborda assuntos que poderíamos classificar, no mínimo, de “melindrosos”, e que para tantos ainda são tabú.
É-me difícil dizer tudo o que penso acerca da sua crónica. São tantas as coisas que me acodem ao pensamento, que, a dar-lhes voz, o meu comentário ficaria maior que a sua crónia E eu não quero isso, de geito nenhum!
Vou, por isso, dar só umas “bicadinhas” aqui e ali…
Casais homosessuais a festejarem bodas de ouro não sei se haverá muitos. Conheço vários que se casaram e seis meses depois estavam separados. Melhor fariam se continuassem solteiros e felizes. Isto aconteceu com homosessuais homens – as mulheres são mais firmes nas suas convicções.
Casais de três ou mais pessoas já existem com fartura (principalmente de três…). O que acontece, a maior parte das vezes, é que eles não sabem uns dos outros. No futuro sairão do armário e serão todos muitpo felizes.
Gostei, particularmente, da alusão às cardinalas. Aí o mundo estará perfeito. Porquê cortar o acesso a mulheres a cargos pontifícios, por exemplo? Ou até a outros de menor relevância?
Há uma lenda da Papisa Joana, sobre a qual escrevi um post no meu blog «Histórias de Encantar», e devo dizer-lhe que não me custa a crer que seja mais do que uma simples lenda…
Vou também retirar-me para o formol:) senão arrisco-me a que o meu comentário tenha mais caracteres do que a sua ÓPTIMA crónica.
Beijinhos
PS – Para além de tudo o mais, a sua escrita é perfeita, por isso nos dá um prazer enorme lê-la.
Muitíssimo obrigada pelo comentário brilhante, Mariazita! Já está mais do que na hora de a Igreja conceder às mulheres a posição que Jesus jamais nos negaria. Também acredito que haja uma certa verdade na história da Papisa Joana. Beijos!
Incrível o seu texto!!!!!! Te admiro….obrigado
A admiração é recíproca, Felippe. Beijos e obrigada!
Adorei seu texto e aprendi aqui muitas coisas que não sabia. Eu não tenho preconceito de nada e de ninguém, meu pai foi um homem formidável que nos orientou para viver a vida da forma mais simples e natural. Como somos do campo assistimos tudo de fora, mas sem jamis ofender quem quer que tenha suas opições de vida. A gente nunca sabe o que pode ser no futuro um de nossos filhos.
Tenha uma ótima semana.
Muito obrigada pelo comentário, Anaja! Seria ótimo se todas as famílias fossem educadas assim. Abraço!
Do futuro não me atrevo a dizer nada.
Cadinho RoCo
Uma atitude deveras prudente, Cadinho. Abraço!
Toda moral que generaliza o particular, que encarna uma “verdade absoluta para todos”, um dever tirano e castrador deve ser combatida, pois gera monstros.
A moral é o mastro que suporta as velas do nosso barco e nos permite avanços na construção de nós mesmos. Esse mastro não está ali para prender quem quer que seja, para receber chicotadas “com razão”.
Mas no caso do deputado Feliciano, expoente do Capitalismo Evangélico, a hipocrisia vira talento profissional, e não faltam ovelhas para dar sustentação ao inaceitável. A moral ali passou longe, o vendilhão do templo distorce conceitos teológicos o quanto pode para conquistar mais mentes tacanhas e preconceituosas.
Concordo com você, Bruno. Obrigada pelo comentário inteligente!
Perfeito texto Carla!
Seria bom demais este soninho no formol! kkk
Um grande bj e obrigada por tua presença no Travessa!
De nada, Gisa! Eu que agradeço. Beijos!
Minha querida
Infelizmente ainda há pessoas que não respeitam os outros tenham eles a opção de vida que tiverem.
Para nos respeitarem temos que respeitar os outros.
Um texto muito reflexivo e que adorei ler.
Um beijinho com carinho
Sonhadora
Muito obrigada pelo carinho, Sonhadora! Beijos!
Olá Carla,
Adorei o tom da crônica. Divertida e com ótima visão futurística-rs.
Gostei muito de estar aqui e de ter a oportunidade de conhecer sua ótima forma de expressão.
Beijo.
Muito obrigada, Vera! Que bom que você gostou! Beijos!