Nota sobre a Conjuntura.

Nota sobre a Conjuntura.

A afrontosa declaração do juiz de primeira instância, Sérgio Moro – questionando o STF por este estar propenso a reexaminar a questão da prisão em segunda instância – é um daqueles sinais mais evidentes de que nosso sistema jurídico está virado de ponta cabeça e desservindo ao país. O respeito à hierarquia, ao que tudo indica, foi para o espaço – literalmente. Ante a questão, o Ministro Marco Aurélio, do STF, reagiu estupefato – e não era para menos.

Moro – falando o que lhe dá na telha, livre e impunemente – e Carmem Lúcia (Ministra e Presidente do STF) – negaceando, solitariamente, para colocar a matéria em discussão no plenário desse tribunal constitucional e, com isso, colocando-o numa crise institucional sem precedentes – são uma amostra da ladeira abaixo que tomou conta do país. Ambos militam abertamente contra um preceito constitucional cristalino, sobre o qual não deveria haver sequer um lapso de dúvida e indecisão.

A escalada da violência política, cujo clímax até aqui foi o assassinato recente da vereadora Marielle Franco, dá sinais de agravamento. A caravana de Lula no Sul está sob clara ameaça de violência por parte do fascismo que segue estimulado pela desordem jurídica do país, promovida justamente por aqueles que tinham o dever de impedi-la. Esse comentário não significa dizer que não pudesse haver protestos contra a presença do ex-Presidente, afinal de contas impedi-los seria igualmente uma atitude contrária aos preceitos democráticos. O que se quer chamar a atenção é sobre as ameaças e atitudes de enfrentamento hostil que, segundo se noticia, permeiam os protestos.

A questão é a seguinte. Caminhamos para uma escalada de violência política e não sabemos onde isso vai parar. O país está dividido ao meio e parece não haver a disposição de se pactuar uma solução democrática. Os autores do golpe – com a Globo à frente – querem, a todo custo, ver o circo pegar fogo. Imaginam que essa caçada judicial ao ex-Presidente Lula, mesmo à custa da conspurcação de nossa Carta Magna, vai trazer bons frutos e emparedar definitivamente os que postulam um outro projeto de país. Nada mais enganoso.

Quando se rasga a Constituição, pode-se esperar o quê? Há solução para nosso país fora da Democracia? Essas são perguntas que deveriam assombrar o sono de todos nós, democratas de todos os quadrantes e de todas as cores. Não sabemos ainda em que condições se darão as eleições este ano, sequer sabemos, com segurança, se haverá eleições. Se não cuidarmos de buscar, com seriedade rapidez e responsabilidade, respostas a essas perguntas, não descortinaremos uma luz no fim do túnel.

Por isso tudo, reveste-se da máxima importância que o STF assuma o controle da situação e decida com maturidade e celeridade sobre a celeuma em torno questão da prisão antes ou somente após trânsito em julgado, resgatando o preceito constitucional que cristalinamente a condiciona. Isso, claramente, beneficiará Lula, mas beneficiará sobretudo o país.

Sem que voltemos ao leito da prudência e do bom senso e, sobretudo, ao leito democrático, o demônio fascista seguirá solto, clamando por sangue.

 


 

Formado em economia pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Foi professor na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Campinas e na Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), onde também coordenou o curso de economia. Um dos fundadores do PT de Piracicaba, foi Deputado Estadual (1986), Deputado Federal (1995-2000) e prefeito de Piracicaba por dois mandatos (1989 a 1992 e 2001 a 2004).

3 thoughts on “Nota sobre a Conjuntura.

  1. Prezado José Machado, excelente análise. Suas ponderações tocam em questões fundamentais. A afirmação do Estado Democrático de Direito é o único caminho para construirmos um país justo e ético.
    Com os melhores cumprimentos, Adelino F. Oliveira

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